quinta-feira, agosto 29, 2013

Passion


Há muito que não é segredo a reverência que o diretor americano Brian De Palma rende a seu mestre Alfred Hitchock. Nos filmes de De Palma, as referências são muitas, quase sempre misturadas a uma atmosfera particular que é como uma assinatura do diretor. Uma atmosfera que não é Hitchcock, mas leva o seu tempero de mistério, suspense e estranheza. O problema é que só tempero não basta.

Em Passion, novo filme de De Palma (refilmagem do francês Crime de Amor [2010], de Alain Corneau), o tempero que é sua assinatura de pouco serve para dar substância a um roteiro frágil.

Contudo, mais até do que a fragilidade do roteiro e de suas pretensões – de ser uma crítica à competitividade corporativa e à vaidade – é justamente essa assinatura, com os maneirismos típicos do diretor, que dá ao filme e à sua atmosfera um gosto de repetido.

Rachel McAdams interpreta a loira e cínica Christine, uma alta executiva de uma agência de publicidade internacional. Entre seus subordinados, a executiva demonstra atenção especial à promissora Isabelle (Noomi Rapace), uma morena com algo de inocente e que admira sua chefe, apesar de manter um caso com seu marido. Mais abaixo nessa hierarquia entra a ruiva Dani (Karoline Herfurth), a dedicada assistente de Isabelle.

No jogo de poder e sedução que se estabelece desde o início, o diretor deixa pouco espaço para sutilezas. Desenha o perfil das personagens não apenas pela cor do cabelo, mas também pelas roupas que vestem, desfazendo parte da ambiguidade proposta nas relações que as entrelaça.

Uma ambiguidade feita menos de nuances de caráter e mais por tentativas de nuances homoeróticas. Aqui o diretor parece se esquecer que sem sutileza não há nuances, pois o erotismo exibido vai do asséptico comportado ao óbvio anunciado. Nesse quadro, as atuações das boas atrizes cai num artificialismo que pode até ser proposital, mas que não deixa de ser apenas mais um ruído no tecido dramático do filme.

A verdade, porém, é que De Palma se repete. Repete-se na criação de uma atmosfera de sensualidade artificial (agora comportada e careta), repete-se na criação de personagens ambíguos que existem claramente apenas em função de um suspense esquemático e repete-se na articulação de um crime que se pretende perfeito, mas que no seu desvendamento não deixa de passar por um longo flashback explicativo.

Nas repetições, estão ali a tela dividida (Carrie, a Estranha, Femme Fatale), a perspectiva em primeira pessoa para ocultar o autor do crime (Missão Impossível, Olhos de Serpente) e os disfarces ou máscaras quase como um sintomático fetiche (Síndrome de Caim, Missão Impossível). Até mesmo o susto final é uma repetição exata do susto final de outro filme do diretor, que não mencionarei para evitar um spoiler involuntário.

Além de toda essa repetição de maneirismos próprios, pontuam a narrativa as típicas referências a Hitchcock, em especial, neste caso, a Um Corpo Que Cai.

Vaidade, fetichismo, voyerismo, assassinato. Também na temática o diretor se repete. Sem inovação, o único refresco é uma tentativa de fazer de Passion uma crítica à ambição desmedida e ao vespeiro cínico das altas cúpulas corporativas, além da questão da imagem na sociedade moderna com sua ultraconectividade e vídeo-dinâmica.

O resultado dessa crítica fica apenas na superfície, fazendo de Passion uma simples história de crime e obsessão, articulado com as mesmas ferramentas que o diretor vem usando há muitos anos. Estas ferramentas até funcionaram bem no passado, mas seu desgaste deixa este novo filme com cara de mais do mesmo, mais uma vez.
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Passion
Brian De Palma
Alemanha/França, 2012
102 min.


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terça-feira, agosto 20, 2013

Flores Raras




Considerada um dos grandes nomes da literatura norte-americana, a poeta Elizabeth Bishop foi por 16 anos companheira da arquiteta brasileira Maria Carlota Costallat de Macedo Soares, conhecida como Lota.

Quando chegou ao Brasil, em 1951, Bishop pretendia ficar apenas alguns dias, antes de seguir num giro pela América do Sul. Mas um incidente envolvendo uma reação alérgica após morder um caju resultou em uma permanência de anos, motivada não pela alergia, mas por uma relação afetiva e poética com Lota.

É a história dessa relação que o diretor Bruno Barreto reconta neste belo e sensível Flores Raras. Um filme de desenvolvimento narrativo afinado e que deve grande parte de seu feliz resultado ao embate cênico de duas atrizes inspiradas.

Glória Pires faz Lota, uma mulher decidida, segura e de pulso firme. Gosta de falar de seu trabalho como arquiteta sem qualquer timidez ou falsa modéstia. A pedido de sua então companheira, Mary (Tracy Middendorf), ela recebe em sua casa Elizabeth Bishop, interpretada por Miranda Otto.

Bishop é quase o oposto de Lota. É tímida, não se sente a vontade para ler seus próprios poemas e reage com certa retração ao imediato choque cultural. Sua atitude é interpretada como esnobismo por Lota, mas logo a antipatia se transformará em paixão.

Na composição dos personagens, Glória Pires realiza uma interpretação de firmeza magnética. Mantém o tempo todo um tom de audácia que representa o destacado papel que a figura real de Lota teve em sua época. Mas o faz sem excessos ou mimetismos caricatos.

Já Miranda Otto compõe sua Bishop com uma fragilidade enviesada, entre o medo de si mesma, a insegurança quanto à sua poesia e a inescapável necessidade de escrever. Há nesta personagem algo de uma força inevitável (a poesia, certamente, mas algo mais) que a fragilidade encobre, mas não esconde.

Esse amálgama é desenvolvido com a sutileza de uma interpretação que até comete pequenos excessos, mas que no todo se humaniza imensamente, auxiliada por flashbacks que remontam a história sofrida da poeta. Mérito da atriz e mérito também da direção.

Bruno Barreto faz de Flores Raras uma peça exemplar de narrativa clássica, redonda e azeitada. Não há solavancos nem artificialismos dramáticos e a música nunca se excede para forçar o drama.

O resultado é uma beleza complicada em que o amor não é tratado como objeto ideal de superações de crises e dificuldades. Em Flores Raras o amor é real e o amor real é, antes de tudo, imperfeito. A condensação dessa imperfeição e desses personagens está na cadência precisa do filme, no seu timing bem executado.

Barreto filma na convenção. Enquadramentos e sequências são ordenados e montados sem exercício dialético, com a precisão narrativa que não subtrai demais nem se estende além. Como a saber que o que interessa são duas mulheres, o Rio de Janeiro de outros tempos, o amor imperfeito e a desventura de uma história a ser contada. No caso, muito bem contada.
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Flores Raras
Bruno Barreto
Brasil, 2013
118 min.

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Bling Ring: A Gangue de Hollywood






“A sick fascination”. Um fascínio doentio. Esta pode ser uma boa forma de descrever como o mundo das celebridades, da moda e do luxo afeta algumas pessoas que se sentem irresistivelmente atraídas por esse universo.

Em Bling Ring: A Gangue de Hollywood, a diretora Sofia Coppola lança sua câmera para uma juventude contaminada por essa irresistível atração. Uma juventude que tenta ostensivamente mimetizar um estilo de vida glamoroso sem se preocupar com os limites entre o artificialismo, a banalidade e a atividade criminosa.

Um grupo de jovens passa a invadir mansões de celebridades para roubar. Esses roubos, no entanto, não se enquadram no simples perfil criminoso que visa só o lucro. Eles estão mais relacionados com a aventura e com a possibilidade desses jovens de chegarem mais perto de um universo revestido de joias, sapatos, roupas de grifes de luxo e de um estilo de vida que os fascina.

Mas o que começa como uma aventura na casa de Paris Hilton (que autorizou as filmagens em sua mansão verdadeira), logo passa a se tornar um hábito inconsequente e sem medida.

O filme se baseia em acontecimentos reais para traçar um perfil desolador de um tipo de juventude que age sob o efeito anestesiante do deslumbramento e da futilidade. Funciona, então, como uma narrativa que desconstrói o vazio encoberto pelo artificial e apresenta personagens tão descolados da realidade quanto os de filmes anteriores da diretora.

Esses desLOCAmentos e desCOLAmentos frente à realidade parecem ser o objeto favorito dos filmes da diretora, através dos quais ela apresenta personagens que transitam numa dimensão à parte; seja porque caíram perdidos e deslocados ante um lugar estranho, seja porque se descolam da realidade enquanto transitam no vazio existencial.

Se em seu filme anterior, Um Lugar Qualquer, Sofia nos imergia em um tipo de tempo dilatado pelo vazio na vida de um astro do cinema (com sua rotina desenganada de sentido, com sua simpatia letárgica e autômata), agora ela nos lança ao vazio que há também no outro lado do espelho.

Aqui, porém, o tempo não se dilata, ele é veloz, preenchido pela rotina entre escola, drogas, compras, festas, baladas e poses para fotos que serão postadas nas redes sociais.

Bling Ring revela comportamentos recorrentes de uma geração (ou parcela preocupantemente expressiva dela) deslumbrada com a aparência e com o status. Uma geração ocupada em disseminar um verniz de poder sedutor com a falsa sofisticação de grifes e de um estilo de vida agitado, que quer “fazer inveja” tanto quanto ele em si é reflexo de igual inveja disfarçada de admiração. O tal fascínio doentio.

Contudo, mais que exibir a valorização estúpida de símbolos de consumo de luxo e celebridades fúteis dispensáveis, o que este retrato traz é mais uma vez o aterrador vazio existencial de seus personagens. Há neles uma letargia diante da vida real, como se existissem em câmera lenta mesmo quando “vivem rápido e morrem jovens” como diz a letra de uma canção do filme.

No universo glorificado pelo supérfluo está a incapacidade de criar vínculos, de estabelecer amizades ou relações familiares sinceras, ou mesmo de serem autênticos.

Comparado com o viés contemplativo de outros filmes da diretora, há menos tempos mortos em Bling Ring. Fala-se mais, move-se mais. De forma inteligente, toda essa agitação não é mais que uma película que muito fragilmente cobre o devastador vazio. Aqui os personagens estão presos a uma artificialidade que pensam ser vida, mas que é outra coisa.

Sofia, contudo, não emite juízo sobre esses personagens. Evita um didatismo moralista, julgador e, consequentemente, simplificador. Sua narrativa explora apenas a idiossincrasia, uma existência cotidiana que revela o ridículo da superficialidade vaidosa e obsessiva. Uma narrativa de construção sem artifícios indutores para apontar e julgar.

Como em outros de seus filmes, a diretora estabelece sempre uma distância entre a intimidade e o caricato, uma distância segura e honesta ante seus personagens. Parte da solidez crescente de seu cinema está nesta qualidade de nos deixar entrever sem precisar apontar. Um recurso que aposta na inteligência do espectador e em sua capacidade de pensar.
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Bling Ring: A Gangue de Hollywood
Sofia Coppola
EUA/Reino Unido/França/Alemanha/Japão, 2013
90 min.

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sexta-feira, agosto 09, 2013

No Lugar Errado

 Diferentemente de trabalhos anteriores, o terceiro filme dos irmãos Pretti e primos Parente se sai como um drama psicológico de camadas finas. A grande diferença de No Lugar Errado para o ótimo Os Monstros e o excelente Estrada para Ythaca, é o registro e a dinâmica cênica.

Isso porque, se neste novo filme permanece a amizade como pilar de sustentação das relações dos personagens, os complicadores agora nascem também dessas relações, apresentando um enriquecimento da “trama afetiva” que parece sempre permear a obra dos autores Pretti e Parente. Reflexo claro do modo de produção do coletivo a que pertencem, a Alumbramento.

Assim, em No Lugar Errado, sai de cena o confortável quase-lírico apaziguamento da amizade, entra a crise iminente.

Das mudanças, a mais drástica diz respeito ao espaço cênico. Com a virtude da experimentação, os diretores se uniram ao diretor teatral Rodrigo Fischcer e filmaram a partir de sua peça, chamada Eutro. Por isso, toda a ação se dá em um palco, um espaço cênico definido e restrito. Com minimalismo cenográfico, o espaço é um apartamento no qual um casal recebe outro casal para uma celebração.

Ali a noite adentra com uma densidade etílica, abrindo caminho para algo mais do que a simples alegria inicial. Gestos e diálogos insinuam sentimentos como mágoas retesadas no tempo ou tensões eróticas que afloram do proibido. Entre explosões insensatas, os personagens se revelam intimamente pelo espelho oblíquo de anseios particulares; misturam frustrações, ressentimentos e angustias com o prazer da amizade e da lealdade posta a prova todo o tempo.

Neste elaborado drama cênico, fogem à clareza, dão as costas ao óbvio e desafiam o consenso quando vão do afago á violência e de volta ao afago a cada nova fissura emotiva exposta pelo silêncio ou pelo grito.

O rigor formal dos planos, marcado pela fotografia em preto e branco, age como um aprisionamento dos quatro personagens. São prisioneiros do plano, do quadro e daquela noite em que revelam – fragilmente tentando esconder – tantas camadas de suas necessidades humanas, carnais e sentimentais, afetivas ou não.

O claro aspecto experimental de No Lugar Errado propõe o risco de errar. Fora do acomodamento, avança em terreno novo, pois se nos trabalhos anteriores dos diretores o conceito de "lugar" era ou amplo ou metafísico, aqui se mostra mais íntimo que nunca.

Talvez não funcione a contento como os outros filmes, mas se mostra vivo pela tentativa e pela disposição ao risco. De certa forma, aqui importa menos conceitos rígidos de erro e acerto (ou de lugar certo e lugar errado). Talvez valha mais a experiência e a busca de algo tão intangível quanto o cenário do filme ou uma estrada para Ythaca.
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No Lugar Errado
Pedro Diogenes, Guto Parente, Luiz Pretti e Ricardo Pretti
Brasil, 2011
70 min.


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segunda-feira, agosto 05, 2013

A Humanidade


Atravessar as duas horas e meia de A Humanidade, filme de 1999 do diretor francês Bruno Dumont, é um exercício de paciência que muitas vezes se aproxima da exasperação. Isso porque, aos poucos, vai crescendo um desejo de que acabe logo aquele arrasto narrativo em que quase nada acontece.

Contudo, ao mesmo tempo, há no filme um modo peculiar de absorver a atenção e enreda-la na trama que faz com que a impaciência seja esquecida constantemente, para voltar logo adiante. No fim, fica a impressão de que A Humanidade não é um filme ruim, nem mesmo prolixo. É antes um grande enigma que nos observa tanto quanto o vamos observando.

Com sua escassez de diálogos, o filme vai delineando seus personagens com uma vitalidade melancólica intensa que só pode ser construída pela lentidão com que o filme os atravessa. Na dificuldade de comunicação que marca suas relações, há um sentimento atravessado que não encontra voz nas palavras, mas apenas em gestos imprecisos e nos olhares distantes.

Assim, o inspetor de polícia Pharaon de Winter (Emmanuel Schotté em desconcertante atuação) lança frequentemente seu olhar distante para as coisas, como se cada uma delas o afetasse intensamente em dor e solidão. É quase um mesmo olhar desesperançado que lança a partir da vista do jardim que cuida, ou para o mar, ou ao tomar o café da manhã ou ao observar sua vizinha Domino (Séverine Caneele) fazendo sexo com o namorado desagradável.

Este é um olhar que nasce para o filme quando vemos, logo no início, Pharaon cair na lama, atônito, depois de ver o corpo de uma menina de 11 anos, morta e violentada. O close que o filme dá na vagina dilacerada da vítima retrata o choque que não se diluirá ao longo do filme, durante a investigação do crime.

Será esta investigação o fio condutor para imersão na vida desse personagem cuja humanidade do título estará representada em uma candura que o desloca da realidade para um mundo quase próprio por trás de seus olhos. Ele mesmo vítima de uma tragédia há dois anos e que revela seu apego pela vizinha operária e suporta seu desconforto com o namorado dela ao aceitar sempre em sair na companhia dos dois.

Na construção de uma peça que revela a incomunicabilidade de personagens que trazem uma latência de desejo e uma clara insuficiência afetiva, Dumont cria um universo quase paralelo, de borda da realidade. Um universo bucólico de pequena cidade em que ambienta uma trama espargida nos silêncios, nas paisagens e na rua onde moram seus dois personagens principais.

Como se houvesse um filme dentro do filme, a trama policial de investigação do crime se dilui na quase ausência de trama que embaraça a vida desses personagens, fazendo deles o foco de uma longa observação que revela aos poucos sentimentos imperfeitos.

A Humanidade não é filme de roteiro. É antes um filme-exercício no qual a figura de Pharaon nos remete a um estado entre a dor e a pureza do homem. Ele e sua intimidade periférica são o objeto de uma contemplação ante a própria contemplação que o filme incorpora o tempo todo.

 Na longa travessia, o resultado ao fim não serve de recompensa aos que buscam respostas claras. Dumnot não está interessado em explicar, embora não use de artifícios para confundir.

Sua narrativa de arrasto apenas nos conduz para um mundo quieto em que a banalidade pode ascender ao terrível e o terrível se mostrar dentro da banalidade. Entre um paradoxo e outro resta o sentimento de incompreensão e algo como um gesto de sacrifico por amor puro e desapego supremo. Como uma imensa humanidade ausente do mundo e do homem.
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L'humanité
Bruno Dumont
França, 1999
148 min.

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sexta-feira, agosto 02, 2013

Wolverine: Imortal

Neste segundo filme solo do personagem dos quadrinhos Wolverine, chega a ser uma surpresa o modo desapressado com que a trama é desenvolvida nos primeiros minutos.

Exatamente por ser um filme de super-herói – e, portanto, um filme de ação – Wolverine: Imortal surpreende por conseguir evitar a afobação que outras produções do gênero têm em começar logo a pancadaria e os malabarismos destrutivos. Aqui, o filme se preocupa antes em criar um cenário e dar vigor aos personagens da trama.

Por uma questão de gênero, naturalmente que a trama e os personagens não terão um desenvolvimento sofisticado, nem é o que se espera desse tipo de filme. Mas é evidente que há um cuidado maior em se criar dúvidas e ambiguidades, evitando o pastiche absolutamente oco tão comum em outros exemplos do mesmo gênero.

É assim que a trama se monta a partir de uma dívida de vida que Wolverine (Hugh Jackman) deixou no Japão durante a Segunda Guerra. É por essa dívida que ele é levado ao país oriental para encontrar seu credor que, à beira da morte e sendo dono de um imensurável império tecnológico, faz a ele uma inesperada oferta.

Há em todo esse primeiro terço do filme um bom cuidado em representar aspectos da cultura japonesa que, mesmo tratados a partir de conhecidos clichês do cinema pop, ainda assim surtem um significativo efeito de atmosfera e, principalmente, de propósitos que alimentam o desenrolar da história.

Mais do que a ambientação local, esse princípio consegue estabelecer certas dúvidas e indefinições, se aproximando até de num bom mistério com elementos do gênero policial, quase um filme dentro do filme, ao menos na atmosfera. É no desenvolvimento desses mistérios e na relação entre Wolverine e jovem Mariko (Tao Okamoto) que a produção exibe suas melhores qualidades. E mesmo a ação não se apresentando apressada e urgente, quando surge corresponde à expectativa.

Contudo, mesmo com tantos acertos, Wolverine: Imortal não escapa de algumas bobagens do gênero. Estão lá os vilões quase sem falas, cuja vilania não se sustenta pelas motivações, além daqueles constrangedores diálogos em que o vilão explica didaticamente seu plano antes de “terminar” com o herói.

Há ainda o ligeiramente repetitivo trauma do herói com a morte de sua amada Jean Grey (Famke Janssen), uma repetição que passa um pouco da conta, mas acaba servindo como uma boa conexão com o histórico do personagem, além de limpar o caminho para que a franquia siga adiante.

Como estrutura narrativa, o filme sofre uma queda considerável de qualidade a partir do último terço, especialmente a partir de uma cena em que Wolverine realiza uma tomografia em si mesmo e que é o ponto de virada da ação. Mas a partir daí o que conta é a ação e esta tem uma boa medida em ritmo, reservando até uma surpresa a respeito da mutação de Wolverine. Uma surpresa até óbvia, mas daquelas obviedades que só merecem esse nome depois que as notamos, daí ser uma boa surpresa e nem tão óbvia assim.

Wolverine: Imortal se mostra, portanto, muito superior ao primeiro filme solo do personagem. Seu roteiro, com elementos tirados de histórias clássicas dos quadrinhos pode até desagradar aos fãs mais exigentes quanto à fidelidade, já que o filme toma diversas liberdades em mudar aspectos das tramas originais. Mas a produção dá conta do essencial e, mais importante, faz o personagem dar um passo adiante na sua evolução dramática.
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The Wolverine
James Mangold
EUA, 2013
128 min.

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