sábado, novembro 06, 2010

À Prova de Morte

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Death Proof
Quentin Tarantino
EUA, 2007
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Com 3 anos de atraso estreou no Brasil À Prova de Morte, de Quentin Tarantino. O filme fez parte do projeto Grindhouse, que Tarantino realizou em parceria com o diretor mexicano Robert Rodriguez. Grindhouse era como se chamavam a sessões duplas de cinema nos anos 70, nos EUA. Exibidas em cinemas baratos, apresentavam sempre dois filmes em seqüência, que invariavelmente eram filmes B, de baixo orçamento, gosto duvidoso e que faziam a alegria de jovens da época.

Há alguns anos Tarantino e Rodriguez se juntaram para homenagear essas sessões e o tipo de filme que apresentavam. Cada um escreveu e dirigiu um filme nos moldes grindhouse, que pretendiam lançar em cópias únicas.

Para serem fieis ao que pretendiam homenagear, filmaram inclusive trailers de filmes falsos que seriam exibidos entre os filmes (um desses trailers fez tanto sucesso que, ao que tudo indica, vai mesmo virar filme). Contudo, por diversas questões, no final Tarantino e Rodriguez optaram por lançar os dois filmes do projeto separados. Robert Rodriguez lançou Planeta Terror e Tarantino À Prova de Morte.

Já tive a oportunidade de assistir a ambos duas vezes. Planeta Terror é um filme que abusa do nonsense ao investir no filme de zumbis. Escatológico, absurdo e exagerado é o mínimo que se pode dizer dele. Não que não seja divertido (ao menos para os fãs do gênero, ainda que mesmo dentre esses muitos desgostaram do filme), mas quando comparado  a À Prova de Morte, fica simplesmente abaixo da crítica.

O que ainda falta em Rodriguez e sobra em Tarantino quando o assunto é referência “B” pode ser explicado em uma única palavra: elegância. Enquanto que do seu lado do díptico de Grindhouse Rodriguez simplesmente empilha referências sem muito critério e com exagerado desleixo, Tarantino pega o fino do gênero, condensa e talha à sua imagem e nos entrega uma obra irretocável.

O diretor do insuperável Pulp Fiction investe no filme de perseguição dos anos 70, com os carrões envenenados, os muscle cars, e seus motores possantes e beberrões, que foram um símbolo de uma época. Mulheres sensuais com shorts jeans, a figura do dublê de filme de ação e seu carro adaptado, está tudo lá. Mas ao contrário de Rodriguez, Tarantino amarra todos os elementos de forma elegante, cadenciada, exibindo seu virtuosismo na construção de diálogos e no controle da tensão.

Na história, Kurt Russel interpreta um dublê de filmes de ação que tem um carro que ele classifica como à prova de morte, pois foi modificado para suportar todo tipo de provação. Num bar de beira de estrada ele trava diálogos com um grupo de garotas. O que elas não desconfiam é das verdadeiras intenções daquele sujeito estranho com uma grande cicatriz no rosto.

À Prova de Morte, como o tipo de filme que homenageia, não possui um roteiro elaborado, nem grandes reviravoltas na trama. Mas é exatamente sua simplicidade e a maneira como ela é trabalhada por um gênio como Tarantino que faz dele um filme acima da média.

Talvez seja preciso um pouco de cultura de filmes B para apreciá-lo por inteiro. Especialmente os “defeitos especiais” que remetem aos filmes antigos do gênero. Coisas como a imitação dos rolos de filmes desgastados e mal conservados da época das grindhouses: riscos na tela, trechos do rolo faltando, som irregular. Tudo para dar o tom certo.

À Prova de Morte condensa todos esses elementos sem nunca perder a medida certa. O faz com equilíbrio e bom gosto, sem também se perder do objetivo, ou seja, sem nunca deixar de parecer um autêntico filme do gênero e da época. Talvez não agrade a todos, especialmente aos não iniciados nos típicos filmes B dos anos 70. Mas é um filme que ilustra com perfeição o cinema de Tarantino, que retira o supra-sumo de um tipo de cinema dito “ruim” e o transforma em obra refinada. Tudo sem deixar a simplicidade de lado e exibindo um bom gosto incrível e um incrível domínio da tensão.

Vale destacar, como sempre, a trilha sonora. Esse é outro ponto que Tarantino sempre acerta. E muita atenção para a antológica sequência de lap dance com a atriz Vanessa Ferlito. Um deleite para os olhos.
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