sexta-feira, janeiro 07, 2011

2:37



2:37
Murali K. Thalluri
Austrália, 2006

“2:37” é um filme cuja tensão cresce sorrateiramente e que guarda um final surpreendente. Neste trabalho, o diretor Murali K. Thalluri não esconde suas fontes. E embora beba delas com evidência, o faz com acuidade e manejo, deixando sua assinatura evidente, como quem vai na esteira, mas sem deixar de caminhar com as próprias pernas.

As fontes a que me refiro são duas: “Beleza Americana”, filme de 1999, dirigido por Sam Mandes, e “Elefante”, de 2003, dirigido por Gus Van Sant. Do primeiro (Beleza Americana), Thalluri se utiliza do conceito temático, que é expor a verdade corroída da intimidade por trás das aparências diante da sociedade. Do segundo (Elefante) o diretor absorve a estética, trazendo os mesmos planos-sequências e a mesma estrutura narrativa, entrelaçando sequências que se revelam de dois ou mais ângulos, ligadas por fios diferentes. Parte também do mesmo princípio para compor sua história: um dia num colégio sob a perspectiva cotidiana dos próprios alunos, revelando a crueldade e a pressão intensa que existe nesse universo de aparências e máscaras.

Contudo, o filme não se estreita unicamente como uma referência a Gus Van Sant e seu “Elefante”, ainda que a estrutura narrativa e até o clima sejam idênticos. No caso de 2:37, há um prelúdio incisivo que o difere e que modifica toda sua estrutura tensional. Se em “Elefante”, a lentidão chega a cansar, em 2:37 temos de súbito, logo no início, o desfecho e isso faz toda a diferença para a preservação do interesse.

Às 2h37 da tarde ocorre um suicídio dentro do colégio, numa sala fechada por dentro. É o ato misterioso que abre a história e será ele o fio condutor de toda uma tensão regressiva e crescente, ampliada lentamente pela imersão na vida dos jovens estudantes, cujas aparências escondem segredos tão dolorosos que qualquer um pode ser o suicida misterioso.

Volta-se para muito antes disso e o dia se inicia comum e cotidiano para os alunos, todos exibindo sua normalidade superficial. Temos ali os principais estereótipos desse período da vida: o casal de irmãos ricos que vão para a escola de Mercedes, a garota linda e popular, o atleta que namora a garota popular, o desajustado envolvido com drogas que quer chocar a todos, o introvertido rejeitado vítima de chacota e piadas.

É a partir de então que se vai tecendo uma teia de segredos, aflições e desarranjos íntimos na vida de cada um dos personagens. Entrecortado por depoimentos em uma provável sessão de terapia e aprofundando o expectador naquele dia da vida de cada um dos personagens, vão surgindo no filme, gradativamente, revelações cada vez mais assustadoras e surpreendentes. Saltam de dentro da normalidade os monstros ocultos sob a superfície das aparências: bulimia, rejeição, homossexualidade, gravidez indesejada, incesto, egoísmo, solidão, estupro, humilhação.

Mergulha-se nos segredos de cada um até o ponto em que se tem convicção absoluta de que qualquer personagem teria suas razões para o suicídio. Resta saber quem de fato o cometeu. E essa é a chave que quando desvelada trará um desfecho não apenas surpreendente, mas avassalador. Um desfecho que nos deixa atordoados, inseguros quanto às certezas construídas pelo filme.
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