Vestir uma roupa ou um acessório apenas porque está na moda, ouvir um tipo de música só porque está bombando nas rádios, fazer alguma coisa sempre do mesmo jeito, apenas porque sempre se fez assim. Em todas essas situações, existe o que podemos chamar de "atitude bovina", que nada mais é do que agir de determinada maneira sem nunca parar para pensar a respeito. Todos nós temos essa atitude. Daí a importância de, em alguns momentos, pararmos e perguntarmos a nós mesmos o porquê de estarmos fazendo a mesma coisa sempre da mesma maneira.
Todo esse papo de autoajuda vem como introdução para contar um fato curioso que me fez entender um pouco mais sobre essa mania chamada cinefilia. Como também sou umas dessas pessoas "mordidas" pela cinefilia, talvez fosse de se esperar que o que vou narrar tivesse acontecido durante uma maratona de filmes. No entanto, ocorreu em um sábado comum, sem festivais ou mostras na cidade.
Tinha trabalhado durante toda a manhã e, ao meio dia, já estava livre de minhas obrigações. Olhei para o relógio e pensei: opa, vai dar para pegar um cinema à tarde. Às 14h estava acomodado no Cine Belas Artes. Enquanto esperava o início do filme, fazia cálculos sobre a sua duração e a hora de início de uma outra sessão no Cinesesc, a poucas quadras dali. Queria ver as duas sessões, mas não tinha certeza se conseguiria chegar a tempo de ver a segunda, que começaria às 16h.
Pergunte-se por quê?

Foi então que aconteceu. Naquele momento, desconfiei que estava tendo uma atitude bovina. Imediatamente parei. Olhei ao redor e me perguntei: por quê? Para que todo aquele sacrifício?
Perguntei-me se não fazia aquilo no automático, como se sendo cinéfilo tivesse, naturalmente, a obrigação de agir como tal e ver filmes apenas por ver filmes. Afinal, naquele momento, não se tratava de uma reflexão sobre pensar o cinema, sobre a análise fílmica ou a crítica como elemento de tradução, transição e permanência da obra. Era algo bem mais simples, tratava-se de entender o porquê de agir como um maluco.
Contudo, de repente, uma imagem me veio à cabeça, uma imagem de um filme (como sempre, a catarse primordial dos cinéfilos), e essa imagem, surgida do nada, me deu toda explicação que eu precisava naquele momento. A imagem era de Harrison Ford. Tinha na cabeça um chapéu e na cintura um chicote. E estava correndo de uma gigante bola de pedra que rolava para esmagá-lo. Uma cena-ícone do filme Os Caçadores da Arca Perdida.
Enfim
O que compreendi através daquela imagem é que o cinéfilo, antes de tudo, é um caçador. Um caçador de filmes. Melhor dizendo, um caçador de emoções, de sensações, de experiências, de narrativas, de imagens, de universos, e de algo maior, insondável, perceptível apenas no silêncio de uma sala de cinema. Vivemos a busca constante pelo filme perfeito, pela cena impecável, pela luz inesquecível. E o fazemos com o afinco e o estoicismo de quem sabe que busca o raro, o improvável, o quase etéreo. Uma busca inglória, feita mais de fracassos que de sucessos, mais de experiências mornas que de experiências marcantes.

Somos caçadores de filmes perdidos, que continuarão perdidos se não os encontrarmos e, às vezes, seguem perdidos mesmo depois de os termos encontrado. Porque cada um encontra o "seu filme" em cada filme que vê: íntimo, único, particular. Porque só através do cinema o universal pode ser íntimo e o íntimo pode ser universal. Sigamos, então, na eterna e sempre renovada esperança de encontrar mais uma arca perdida. Porque somos cinéfilos.
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Publicado originalmente no site Cinema em Cena em 18/01/11
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