Jack Goes Boating
Philip Seymour Hoffman
EUA, 2010
90 min.
De um afetado playboy em “O Talentoso Ripley” a um gélido vilão que rouba a cena em “Missão Impossível III”, passando pelo escritor americano Truman Capote em “Capote”, Philip Seymour Hoffman sempre se mostrou um ator versátil e competente. Agora, com o filme “Vejo Você no Próximo Verão” - que entra em cartaz na próxima sexta (22) - além de atuar, ele também estreia na direção. Uma estreia em que mostra a mesma competência, realizando um filme de camadas sutis sobre relacionamento, expectativa, confiança e frustração.

Tentando ajudar Jack a encontrar um par romântico, Clyde e Lucy realizam um jantar para apresentá-lo à retraída Connie (Amy Ryan), a nova colega de trabalho de Lucy. A partir desse encontro nasce um hesitante namoro entre dois estranhos carregados de insegurança, que buscam afeto e aceitação.
A deixa para que surja essa relação, inicialmente vacilante, vem de uma conversa casual entre Jack e Connie, quando comentam sobre a expectativa da chegada do verão, embora ainda estejam no início do inverno. De maneira absolutamente aleatória, Jack comenta como seria legal um passeio de barco no verão, no que Connie concorda. É o que basta para Jack tentar superar seus medos e começar a aprender a nadar com seu amigo Clyde.
Essa ansiedade em se preparar para um encontro imaginado para dali a seis meses revela traços da insegurança e desajeitamento de Jack em lidar com emoções e relacionamentos. Algo quase inédito para ele. Esta ansiedade e obcessão aumentam quando, num outro momento, ele e Connie cometam sobre jantar juntos em breve. Ao ouvir ela dizer que ninguém nunca cozinhou para ela antes, Jack se aplica em um novo objetivo: aprender a cozinhar um prato perfeito para Connie.
Em paralelo aos esforços de Jack com Connie, está o casamento de Clyde e Lucy. Afetados pela quebra de confiança causada por um caso extraconjugal, o casal sofre o desgaste da relação, que se deteriora por dentro e sem grandes aparências, como algo retido e cozido no caldeirão das mágoas. Essa deterioração vai explodir num momento crucial, de forma áspera e sem retorno.
Enquanto isso, vemos Jack em um esforço sincero e dedicado para atender as expectativas de Connie. Nesse processo de aproximação estão em jogo a confiança e a cumplicidade que se vai criando entre ambos, no modo como tateiam por uma intimidade difícil de alcançar em razão de suas personalidades tímidas e problemáticas. São barreiras complexas e delicadas, que envolvem traumas e inseguranças.
Entre o declínio da confiança e cumplicidade do casal Clyde e Lucy e a construção dessa mesma confiança e cumplicidade em Jack e Connie, o filme vai se compondo como uma lírica passagem do tempo, em que o aprendizado do outro e de si mesmo é explorado na tela com beleza, delicadeza e uma trilha sonora muito bem escolhida.

Ainda que não seja um trabalho à prova de críticas, com algumas superficialidades e artificialismos pontuais no roteiro, esta estreia de Philip Seymour Hoffman na direção é auspiciosa. Pela delicadeza de conduzir uma história honesta sobre solidão e desvelamento, confiança e afeto, e pela abordagem que foge de clichês e se mostra competente, atuando no subjetivo das relações, sem se entregar a obviedades.
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