sábado, junho 11, 2011

Belair



Belair
Bruno Safadi e Noa Bressane
Brasil, 2010
70 min.

Para um país sem memória como o Brasil, que quase não dá importância e valor para sua história e para a história de seu cinema, um filme como “Belair” - que entrou em cartaz na última sexta (10) - é um respiro de alívio e esperança em meio à tragédia do nosso esquecimento.

Belair é o nome da produtora que os cineastas Rogério Sganzerla e Júlio Bressane criaram em 1970. Ela durou apenas quatro meses e nesse curto período os dois diretores realizaram sete filmes de longa metragem. A iniciativa só não frutificou mais porque os néscios que governavam o país, sob ditadura, não viram aqueles filmes com bons olhos. Pressionados, Bressane e Sganzerla saem do país. Seus filmes nunca são lançados.

Os dois diretores são referência naquilo que à época se chamou de cinema marginal. Expoentes desse cinema, os filmes “O Bandido da Luz Vermelha”, de Sganzerla, e “O Anjo Nasceu”, de Bressane, agitaram as rodas de debates cinematográficos e também políticos da época. Com uma estética que não disfarçava a precariedade das produções e ao mesmo tempo compunha a linguagem anárquica da montagem, o tom provocativo das imagens, tendo o deboche e a performance como substância da reflexão, esses filmes incomodavam muita gente. Mas, acima de tudo, estavam a frente de seu tempo.

Com os filmes da Belair não foi diferente. Correndo o risco de caírem no esquecimento e com um desses filmes (Carnaval na Lama) irremediavelmente perdido por deterioração, essa história e esses filmes são finalmente resgatados pelos diretores Bruno Safadi e Noa Bressane.

Mais do que simplesmente contar a história, o documentário “Belair” dialoga com os filmes realizados pela produtora. Essa foi a intenção dos diretores, que desde o início do projeto descartaram fazer um documentário no padrão entrevista filmada, imagem de arquivo, narração em off, entrevista filmada de novo. O caminho que encontraram foi, através das imagens dos próprios filmes da Belair e através de uma montagem que revivesse em parte a linguagem desses filmes, contar essa história e também fazer conhecer esses filmes.

Num caso raro, que transcende a metalinguagem, objeto e objetivação se confundem, se mesclam e se complementam. E, mais importante que tudo, se fazem entender.

“Belair”, o documentário, por si só já seria de suma importância pelo que contribui para a preservação da memória do nosso cinema (e isso vai além do filme pronto, se refletindo no despertar de algumas “entidades” da nossa sociedade para a restauração desses filmes). Consegue, no entanto, ir além e se torna em uma obra não apenas boa (necessária) de se conhecer, mas, especialmente, prazerosa de se ver. Tem humor, tem crítica, tem deboche, tem marginalidade. Tem, sobretudo, alma. Matriz essencial do cinema de Rogério Sganzerla, Júlio Bressane e de tantos outros que, mesmo estando à margem, insistem em provocar e contribuir.
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