sexta-feira, novembro 22, 2013

Blue Jasmine

Alguns risos provocados pelas situações de Blue Jasmine, novo filme de Woody Allen, são carregados de certo desconforto. Há graça na situação, daí o riso. Mas a graça está na superfície, pois o miolo do que se revela em cena tem algo de constrangedor, daí o desconforto. Apressadamente, pode-se confundir com humor negro, mas o que temos aí é humor ácido.

Não é de hoje que Woody Allen descortina em suas tramas a patetice que há nos dramas da sociedade moderna e em nossas sempre conflituosas relações humanas. Porém, com o passar do tempo – e peneirando-se o que realmente tem qualidade em uma produção prolixa que se torna cada vez mais irregular – o resultado desse descortinado parece caminhar para o melancólico.

Melancolia esta que agora surge até como uma obviedade cravada no título, em que “blue”, como se sabe, indica tristeza. Jasmine (Cate Blanchett) é uma socialite que ficou dura depois de o marido rico ser preso por falcatruas financeiras. Ela então vai morar com a irmã pobre em San Francisco.

A situação que se desenha com isso poderia resultar numa pilha de clichês envolvendo o conflito de classes, com farpas de afetação, preconceitos, constrangimentos e o manjado choque de camadas sociais distintas.

De fato, há um pouco disso no início de Blue Jasmine, mas Woody Allen logo direciona sua trama para revelar não a óbvia superfície desse conflito, mas o caráter mais íntimo de suas personagens.

O diretor até brinca com a obviedade – que logo dispensará – ao fazer de Jasmine a loira e de Ginger (Sally Hawkins), a irmã pobre, a morena. Explica-se: ambas foram adotadas. Daí em diante, contudo, trabalha seus personagens desmontando gradativamente o maniqueísmo aparente. É nesse desmonte que o filme cresce.

Em narrativa paralela, Allen vai contar como Jasmine chegou ao desamparo financeiro. Ao mesmo tempo, por meio da excelente atuação de Cate Blanchett, revela as consequências do trauma que a levou à lona. Nesse aspecto, o trabalho de Blanchett merece destaque.

Ela compõe na medida uma personagem que se apresenta detestável e ridícula em sua afetação. No entanto, o faz com boa dose de autêntica fragilidade, desmontando-a em sua soberba. Para isso, alterna-se em doses de insanidade, que ora passa pelo cômico, ora pelo sinistro e ora se confunde um e outro, feito riso e desconforto.

No oposto, vemos a vida ordinária de Ginger, cujas perspectivas não vão além dos dois filhos cujo pai (seu ex-marido) se ressente da ex-cunhada, um futuro novo marido grosseirão que vai da explosão agressiva à fragilidade infantil e uma carreira fadada a caixa de supermercado. Allen não constrói nela a virtuosidade do simples, mas o fado disso.

Sem deixar de lado o humor natural da vida, melhor qualidade do cinema de Woody Allen, Blue Jasmine desenvolve, em meio aos conflitos, ingênuas aspirações feitas de esperanças e alimentadas por inverdades.

No que poderia ser esquemático e previsível, desconstrói no espectador certezas que se desmancham na humanização de quase todos que passam pela tela. Sai o maniqueísmo do certo e entra o sentimento do difuso, mais real e menos simples de ser digerido. Ora odiamos, ora nos apiedamos.

Mas Allen não facilita e por baixo da camada de humor e graça que cobre quase todo o filme, despeja uma acidez que faz desse humor algo amargo e melancólico. Não deixa muito espaço para sonhos, apenas o desconforto que, sob a espuma do riso, esconde uma conformação ao que se está fadado e uma falsa alegria contraposta a um grande pessimismo. É o que faz de Blue Jasmine um dos melhores entre os filmes recentes do diretor.
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Blue Jasmine
Woody Allen
EUA, 2013
98 min.

Trailer

1 comentários:

Bárbara Bruna Barbosa disse...

Ahhh muito bommmm! E o Hao, a nova página só para vídeos, já viram? Tem notícias assim, mas ficou demais porque é mais interativo e tal, não tem essa moderação e tal. A página nova: http://br.hao123.com/movie?tn=fb_self_wt_01_movie_br

 

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