sábado, dezembro 25, 2010

O Casamento de Rachel



Rachel Getting Married
Jonathan Demme
EUA, 2008

Todo filme de casamento é igual. Ou ao menos tem uma sequência – a do casamento, claro – que é igual a todas as outras em qualquer filme.

Talvez a coisa mais fácil, a receita mais pronta para agradar ao público seja uma sequência de festa de casamento: tem a música, os personagens dançando, os personagens fazendo declarações de amor, ou de amizade, ou de admiração, ou de votos, entremeadas por piadinhas e coisas do gênero. Fórmula fácil de realizar e certeira em agradar. É por isso que na sequência da festa em “O Casamento de Rache”l nada há de novo. Contudo, as semelhanças entre este filme e um filme qualquer de casamento terminam por aí. 

“O Casamento de Rachel” é um filme sobre casamento, sim; mas neste caso o casamento é só a panela onde fervilhará anos de ressentimentos, culpas e transtornos familiares. Uma panela que ferve por baixo das aparências, das gentilezas, dos sorrisos, mas que está sempre pronta a explodir.

Anne Hathaway interpreta Kym, uma dependente química em reabilitação que recebe alta para ir ao casamento da irmã. Sua chegada, depois de meses internada, gera um disfarçado desconforto e uma constante tensão. Cercada de cuidados e carinhos pelo pai, recebida com afeto pela irmã e descaso pela melhor amiga da irmã (com quem não se dá bem), ela passa a se sentir sufocada e estranha.

É à partir do acúmulo lento de fatores que Kym passa a disputar atenção e querer seu espaço na família. Ela está em franco empenho no programa de 12 passos e busca no momento a reparação por seus erros do passado. Mas não deixa de ser a menina indômita que sempre foi e de sentir que é uma célula estranha naquele organismo familiar. 

Há também no passado dessa família uma tragédia não comentada, que marcou a todos e pela qual Kym se culpa e pela qual todos a culpam. Uma mancha nas relações que quase sempre está oculta por trás dos sorrisos, mas que virá à tona em algum momento.

O diretor Jonathan Demme conduz esse fio de conflito com um olhar quase documental, fazendo com que a câmera siga Kym pela casa. É um olhar quase testemunhal da solidão de Kym, seu estranhamento entre os cômodos, as pessoas e o passado.

O filme também tem o excelente mérito de fugir de estereótipos e definições muito claras sobre cada personagem. Assim, o que em princípio parece óbvio, no decorrer se mostra ambíguo. Há uma dissolução de margens, onde ora nos parece que Kym é vítima do acomodamento familiar conservador, ora a vemos como alguém que precisa chamar a atenção por egoísmo e capricho. Essa dissolução de fronteiras, das definições claras de “inocentes” e “culpados”, dá ao filme uma riqueza de possibilidades.

No final o que se vê é que as coisas seguem seus rumos e que todos, cada um a sua maneira - e nem sempre da maneira mais fácil –, tem de conviver com suas culpas e lembranças dolorosas. E que nem sempre existe maldade nas ações que machucam, elas às vezes simplesmente machucam e não há nada que se possa fazer depois para que doam menos.
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