quarta-feira, dezembro 22, 2010

Ano Unha



Año Uña
Jonás Cuarón 
México, 2007

Pode ser precoce afirmar que o jovem Jonas Cuarón herdou de seu pai, Alfonso Cuarón, um talento requintado como diretor de cinema. Mas não é exagero afirmar que seu filme “Ano Unha” é um trabalho que impressiona pela ousadia e pela criatividade. 

“Ano Unha”, logo de cara, subverte a essência do cinema e sua premissa básica: a imagem em movimento. E com esse atrevimento põe de lado mais de um século de história da sétima arte para contar uma história simples a envolvente, tendo como ferramenta apenas diálogos, fluxos de pensamento e imagens estáticas.

Como o próprio Cuarón explicou ao final da exibição, durante um ano ele tirou fotos de tudo e de todos ao seu redor, especialmente de sua família, incluindo aí sua noiva. À partir da organização dessas fotos, Cuarón criou uma história fictícia, na qual as pessoas que aparecem nas fotos tornam-se personagens dessa história.

Assim, o filme é constituído por uma seqüência de fotografias, imagens estáticas, sobre as quais se constrói os dramas dos personagens, com diálogos inteligentes e pensamentos reveladores.

Crítica, envolvente e irônica, a narrativa parte de uma história comum para destilar nas entrelinhas do texto afiado coisas como a estereotipagem do preconceito, as febres da juventude, a busca por um norte na passagem para a vida adulta, as expectativas da paixão adolescente e suas comicidades e desconcertos.

Na história, Molly é uma universitária americana que vai ao México fazer intercâmbio de idioma. Diego é um mexicano imberbe que vive a febre da descoberta da sexualidade na adolescência e passa boa parte de seu tempo em devaneios eróticos protagonizados por sua prima.

Quando Molly e Diego se conhecem, surge uma relação que, num crescente delicado e engraçado, vai explorar os anseios hormonais do jovem mexicano e as fragilidades e inseguranças da universitária americana. E é a tensão superficial dessa química que manterá o expectador envolvido até o fim da película.

O grande mérito de Cuarón, não apenas como diretor, mas também como autor do roteiro, é o de fazer a platéia esquecer-se rapidamente da ausência de movimento das imagens e envolver-se rápida e intensamente com o drama dos personagens. Com isso, o que começa como uma aparentemente monótona sessão de slides com dublagem, logo se torna uma divertida história de amor impossível.

E tão envolvidos ficamos com a trama, que quase não se nota a transição das imagens do monocromático para o colorido, numa interessante alusão à memória das recordações, como explicou o diretor, que são menos nítidas à medida que se distanciam no tempo.

Ao subverter o suposto preceito básico do cinematógrafo - a captação do movimento – e tudo que dele adveio desde sua invenção em 1895, Jonás Cuarón mostra que o verdadeiro preceito básico do cinema é a narrativa. O movimento da imagem e com ele os grandiosos efeitos especiais que as tecnologias digitais trouxeram para o bem e para o mal do cinema de hoje podem ser nada, podem ser pó, sem uma história de verdade.

É o que nos revela o jovem Cuarón: que por trás de uma simplicidade criativa, mesmo sem movimento – mas sempre à partir da imagem -, é possível fazer bom cinema.
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