quinta-feira, dezembro 16, 2010

Felix e Lola





Felix et Lola
Patrice Leconte
França, 2001

Em Felix e Lola, o diretor francês Patrice Leconte transforma um parque de diversões em metáfora e contraste de um relacionamento marcado pela insegurança. Lugar improvável para uma história de amor repleta de medos e mistérios, o parque, com sua alegria artificial de ruídos de músicas alegres e algazarra do público, se transforma no emblemático cenário das incertezas e da solidão de Felix (Philippe Torreton), bem como da tristeza e melancolia de Lola (Charlotte Gainsbourg).

Responsável pelos carros de batida do parque, Felix se envolve com Lola, uma mulher misteriosa que ronda pelo parque. Ele é um homem solitário, mas não triste. Seus amigos, todos do parque, o conhecem há muitos anos, pois vivem como uma pequena comunidade circense, mudando-se com o parque de tempos em tempos. Lola surge na vida de Felix como um desarranjo de sua normalidade previsível. Ela representa o mistério, o insondável, pois parece guardar um grande segredo e fugir de algo em seu passado. E está sempre triste.

É justamente o mistério aparentemente insondável em Lola e sua melancolia sólida que parece fascinar Felix. Como em uma montanha russa, ele experimenta um mergulho no desconhecido ao se envolver com ela e tudo passa a ser insegurança e mistério. Como na cena em que ao chegar em casa vai direto ao armário ver se as coisas dela continuam lá. Essa constante insegurança cria uma inversão do senso comum, fazendo de Felix o sexo frágil da relação.

Mas o grande elemento do filme é Lola. Sua tristeza permanente e os mistérios que ela teima em esconder de Felix a tornam uma figura de incrível fascínio. Lola se comporta como uma fugitiva, como se guardasse em seu passado coisas terríveis e buscasse um porto seguro para sua vida. Mas Lola parece fugir até mesmo do intangível, ou de si mesma, e a paixão incontestável de Felix parece ser sua única chance de encontrar alguma paz.

Felix, por sua vez, sabe que há algo de muito errado acontecendo, algo de muito grave. Mas Lola o faz prometer confiança total nela, obrigando-o a não se envolver no que quer que esteja acontecendo com ela. Somente aos pouco ela vai lhe revelando fatos sobre seu passado, criando um vínculo, uma espécie de cumplicidade fragmentada. E é esse também um vínculo instável, mutável, que se modifica a cada nova revelação.

A direção de Patrice Leconte é simples, mas apurada. Sua câmera quase sempre instável e os zooms curtos e rápidos dão a dimensão da ausência de chão que muitas vezes toma os personagens, especialmente Felix, e a falta de equilíbrio que toma suas vidas. A beleza incomum da atriz Charlotte Gainsbourg e sua interpretação intensa criam uma Lola repleta de enigmas, alguns que ela mesma parece desconhecer, tornando-a atraente não pelo que mostra, mas pelo que esconde.

Contudo, quando no fim tudo se esclarece em definitivo é que o filme de Leconte demonstra uma sutileza e uma delicadeza extrema. É quando todas as cartas são colocadas na mesa e não há mais nada a esconder. Mas essas revelações finais não parecem trazer qualquer garantia de segurança a Felix e Lola. E tudo que resta é a promessa e o desejo inegável de ambos em encontrarem seus significados e seus caminhos. Mesmo que a trilha a seguir seja sempre a da incerteza.
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