quinta-feira, julho 07, 2011

Corações Perdidos



Wellcome To The Rileys
Jake Scott
EUA, 2010
110 min.

Mais conhecido por realizar documentários em vídeo de bandas como U2, R.E.M. e Smashing Pumpkins (e por ser filho do consagrado diretor Ridley Scott), Jake Scott retorna ao cinema depois de mais de 10 anos. Seu primeiro longa-metragem, de 1999, “Plunkett & Macleane”, não foi exatamente um sucesso. Agora, em seu mais recente filme, que estreia nesta sexta (08), o jovem diretor nos apresenta uma bela história de reconciliação com a vida.

Em “Corações Perdidos” temos um casal de meia idade que passa por uma crise de estranhamento e afastamento, consequência do trauma da perda da filha, morta em um acidente de carro. Doug Riley (James Gandolfini), dono de uma bem sucedida loja de ferragens, se desvencilha do drama íntimo de sua casa com a uma amante, por quem tem profundo afeto. Mary (Melissa Leo), sua esposa, sofre com a síndrome do pânico que a impede de sair de casa. Entre remédios e clausura, Mary parece já ter se despedido da vida e do mundo, enquanto seu marido ainda quer viver de alguma forma.

O filme de Scott talvez traga uma inevitável comparação. “Reencontrando da Felicidade”, que esteve em cartaz por aqui recentemente, também trazia um casal que perdera o filho em acidente de carro. Contudo, os filmes guardam interessantes diferenças entre si, ainda que se assemelhem na problematização da perda.

Ambos mostram casais cuja relação saiu dos trilhos depois da tragédia. Mas enquanto “Reencontrando a Felicidade” vai pelo caminho da busca de eixo de equilíbrio e futuro, em “Corações Perdidos” o sentimento é a necessidade de sair do limbo. São diferenças sutis, mas que no desenrolar de cada filme geram sentimentos e situações distintas.

No caso dos Rileys, as coisas começam a mudar quando uma inesperada e dolorosa notícia chega até Doug. Ainda abalado, ele faz uma viagem de negócios para New Orleans. Lá ele conhece Mallory (Kristen Stewart), nome de guerra de uma garota de 16 anos que se apresenta numa casa de strip-teaser.

Depois de um começo ríspido, surge entre eles uma relação na qual Doug, previsivelmente, cria um processo de transferência afetuosa para a jovem garota. A relação, naturalmente, é problemática e tende a se agravar quando Mary descobre o que está acontecendo.

Scott conduz seu filme com uma carga bastante moderada de emoção, fugindo sempre do sentimentalismo. Segue a cartilha do cinema independente americano contemporâneo, com trilha sonora discreta e recorrente, personagens desajustados em seu mundo, narrativa cadenciada sem grandes sobressaltos. Nessa linha, consegue criar uma história interessante, capaz de gerar expectativa pelo seu desdobramento e desfecho.

“Corações Perdidos” é uma história de retomada, da redescoberta de sentimentos trancados no porão da dor e do luto. Sem exageros, mostra a transformação, o expurgo necessário do passado e o desejo de tornar melhor o futuro. Apesar de alguns pontos de verossimilhança discutíveis, é capaz de criar situações interessantes e desenvolver seus personagens de forma a nos parecerem ternos e frágeis, mesmo quando demonstram uma agressividade intensa. São personagens vítimas de certo abandono e desesperança, que tentam, por algum tempo, se agarrarem a uma ilusão de reconforto e restituição.

Contudo, a natureza das ilusões que criam logo se mostra frágil, ainda que não totalmente dissolúvel. Como diz um personagem em certo momento, talvez seja tarde demais para restituir o que todos, em algum momento de suas vidas, já perderam. Mas resta um vínculo de afeto, gratidão e recompensa que perdurará. E isso, para aqueles que precisam ter de quem cuidar (ou aqueles que precisam ter alguém que cuide deles) é algo de valor suficiente para que a vida siga um pouco melhor. Se não plena de felicidade, ao menos com um pouco mais de esperança. Uma esperança presente na capacidade de voltar a sorrir e ter afeto.
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