quarta-feira, dezembro 08, 2010

O Céu de Suely

O Céu de Suely
Karin Aïnouz
Brasi, 2006

Grandes são os filmes que no seu desfecho realizam a somatória de seus fragmentos através da imagem, dispensando palavras e explicações. São filmes assim que crescem incrivelmente no final, por sobre a simplicidade aparente de suas cenas, deixando um sonoro sentimento no silêncio da imagem, que você entende, mesmo sem saber explicar.

Assim é O Céu de Suely, um filme belíssimo dirigido por Karin Aïnouz.

Suely, na verdade é Hermila, uma jovem de 21 anos que retorna à sua cidade natal, Iguatu, no interior do Ceará. Trás no colo um filho pequeno e a promessa do pai da criança de se juntar a ela em breve. Com o tempo, Hermila se dá conta de que nada vai acontecer, que tudo ficou na promessa. Está novamente sozinha e sem perspectiva.

Decide então, mais uma vez, partir. E essa decisão é a primeira mostra de que Hermila não pode ficar, porque partir é seu único meio de ser e de sonhar.

E é para poder partir que Hermila se torna Suely. Prometendo o paraíso numa noite, rifando a si mesma. Uma situação que só o irreal de um sufocante universo real pode conceber. É o céu o que promete Suely, para que o céu possa buscar Hermila. Ainda que esta última não saiba exatamente o que é e onde possa estar seu céu.

O filme de Karin Aïnouz cria assim uma fábula sem moral, retrato do desconcerto e sem-rumo de uma jovem, cujos sonhos ocultos em seu semblante fechado não encontram paragem que lhe dê alento, nem mais que uma esperança imprecisa de pouso na vida. E para construir essa história de moral cansada e lírica sutileza, Karim compõe sobre matéria árida, de poucas palavras, de gestos representativos, cotidianos de uma realidade sem glamour, sem brilho, sem céu.

A vida de Hermila e o céu de Suely são opostos complementares, como a realidade simples e crua de qualquer mulher nordestina que sonha o céu sem saber o que é, querendo um destino que não se sabe por onde começa. Mas Suely ou Hermila não se assentam na conformação e mesmo sem saber para onde, partem. Porque ficar não é uma possibilidade tangível.

Não há grandes sentidos nas vidas de O Céu de Suely, só a continuidade sem remédio, seja pelo sonho que não se sabe, seja pela impossibilidade de se ficar estanque frente à vida, seja pela solidão a que ela nos condena. O céu de Suely é intangível como todo céu e por isso sua busca não tem fim. Por isso Hermila parte em busca de seu céu, mesmo que para isso tenha que deixar para trás o céu de outras pessoas.
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