sábado, setembro 03, 2011

Medianeras – Buenos Aires na Era do Amor Virtual


Medianeras
Gustavo Taretto
Argentina/Espanha/Alemanha, 2011
95 min.

“Medianeras”, que entrou em cartaz neste final de semana, expõe em sua abertura uma curiosa relação entre a cidade de Buenos Aires, sua arquitetura desorganizada e a solidão das pessoas. No final dessa abertura, quando o narrador enumera alguns males do nosso tempo - como o estresse, a violência, o suicídio, a depressão - e ilustra cada um deles com a imagem de um edifício correspondente, temos a impressão de que realmente somos moldados pela cidade que habitamos.

Conhecemos então Martín (Javier Drolas). Isolado em seu pequeno apartamento, ele trabalha como web designer e pouco sai de casa. Martín sofre de algumas neuroses, tem medo de elevador, ataques de pânico. Em tratamento, sai de casa apenas para ir ao psicanalista, fazer natação ou levar o cão para passear. Também se recupera de uma desilusão: a noiva, que foi passar uns dias nos EUA, decidiu ficar por lá.

Na mesma rua de Martín, em outro edifício, vive Mariana (Pilar López de Ayala). Ela é uma arquiteta que ainda não fez nenhum prédio e trabalha como vitrinista. Está de volta a seu apartamento, que deixou quatro anos atrás para viver um relacionamento que não deu certo. Entre manequins e caixas de papelão, sofre também de fobias como medo de elevador. Sai apenas para montar suas vitrines e praticar natação.

Martín e Mariana vivem sua solidão de modos diferentes. Enquanto ele preenche o vazio de sua vida com banalidades e distrações (jogos, coleções, internet), ela experimenta de forma muito mais intensa esse vazio; chora, enclausura-se. Sua companhia é o silêncio, cigarros, manequins, plásticos bolha.

Ambos ensaiam novos relacionamentos. Uma calada e distante garota que leva cachorros para passear, a música do piano de um vizinho que nunca se viu. Em maior ou menor grau, são relações abstratas. Seus “silêncios” e seus “ruídos” deixam transparecer o quanto não preenchem, o quanto são artificiais.

Como se suas vidas fossem a metáfora dos pequenos e mal iluminados apartamentos em que vivem, sentem que precisam abrir mais janelas. Mais luz e outras perspectivas é o resultado disso, quando quebram a parede do apartamento. Abrem suas janelas na lateral do prédio, na “medianera” do edifício. Sorriem quando começa a surgir essa nova janela. O gesto de fazê-la um pouco com as próprias mãos anuncia o desejo que têm de se abrir mais para o mundo e mais para a vida. Vai-se, pouco a pouco, a penumbra de seus apartamentos.

Estreia do diretor Gustavo Taretto em longa metragem, o roteiro enxuto e a narrativa dosada trabalham com inteligência, humor e carisma a solidão desses personagens. Apesar das semelhanças e da proximidade geográfica entre eles, é a cidade - e seus edifícios - que os distanciam.

Na ironia dessa cidade, muitas vezes se cruzam na multidão, mas não se veem. Um paradoxo poético, azeitado com a delicadeza dos personagens,  uma direção de grande sensibilidade e um final criativo.
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