True Grit
Ethan Coen e Joel Coen
EUA, 2010
A grande falta que se faz sentir em “Bravura Indômita” é a construção (perdoem-me pelo palavrão) diegética. Essa ausência faz do filme uma experiência oca, na qual o sentimento e a emoção passam ao largo. Claro que se tratando do gênero western, não há necessidade de “construir” a diegese desse mítico universo fílmico. Ele é de conhecimento universal. O que me incomoda, esclareço, é a forma como a narrativa parece não dar tempo para que a personagem Mattie Ross (Hailee Steinfeld) pareça crível e sua vingança uma real necessidade.

No primeiro terço do filme a jovem Steinfeld se destaca com sua interpretação de Mattie. Vai de um lugar a outro negociando desde o funeral do pai até a contratação de um caçador de recompensas. Ela se mostra dura e escorregadia nas negociações. É decidida, inteligente, perspicaz e tem a língua afiada. Porém, apesar da ótima atuação da jovem atriz, a narrativa peca por uma edição rápida demais. Não há tempo para que se construa toda a força de Mattie. Nem o que realmente vale para ela o enforcamento de Chaney. Tudo se passa rápido demais e impessoal demais.
Quando percebemos, já estamos na primeira cena chave do filme, a travessia do rio. Essa cena, que deveria simbolizar com uma força enorme a passagem de Mattie, sem possibilidade de retorno ou arrependimento, para a vida adulta e todas agruras que viriam depois, perde grande parte de sua força por conta dá má construção que a precede. E é essa falha de fundamento que compromete a força de todo o filme restante. Por que se “Bravura Indômita” é um filme bom, certamente poderia ser muito melhor.
A recompensa, no entanto, pelo início ruim, vem da atuação de Jeff Bridges como o beberrão, insensível e durão Cogburn. Com seu tapa-olho, suas intermináveis histórias e seu gatilho certeiro, representa com clareza a violência e a dureza de um tempo no qual os homens tinham que ser lobos. Nada mais sintomático da mitologia do western - e daqueles tempos em que os homens da lei eram dúbios e seus métodos necessários – que um oficial do governo seja um ex-assaltante que já foi procurado pela justiça. Essa ambivalência entre lei e desordem funciona perfeitamente na persona de Cogburn.
O contraponto de Cogburn surge na figura de Laboeuf. Como Texas Ranger, Laboeuf mantém seu sentido de dever, honra e valor simbolizados na estrela que carrega no peito. É um homem instruído e audaz que busca aventura e recompensa. Torna-se um oposto e complemento de Cogburn, através de uma relação ríspida, irônica e desafetada. Mas mesmo nisso o filme mostra fraqueza, enfatizando essa relação em alguns diálogos afiados e irônicos, e só.
Entre os dois está a garota, determinada em sua vingança. Dessa forma, a narrativa segue um dos “leitmotiv” (sim, outro palavrão) do gênero, a vingança. Pois é em torno da determinação de Mattie que a história gira e será esse desejo ferrenho que moverá a todos. Apesar de deficitariamente construída essa obcessão e o significado da vingança de Mattie, o confronto final será intenso e o desfecho não poupará ninguém das marcas permanentes dessa caçada feroz. Especialmente Mattie, como se verá ao final do filme.

No final, o filme dos Coen termina como uma experiência de emoção reservada e empatia muito tênue. Não parece haver a mesma paixão e intensidade de outros filmes da dupla, o que nesse caso específico seria mais que desejável. Não é mau filme, pois os Coen ainda não devem ter aprendido a fazer filme ruim, mas certamente fica um tanto abaixo da média e da expectativa gerada.
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