segunda-feira, outubro 20, 2014

O Retorno de Antígona

Uma série de imagens pontua as transições da narrativa de O Retorno de Antígona. Em quase todas, paisagens imóveis. A mais sintomática revela as hélices paradas em uma usina de energia eólica, como se nem o vendo se movesse naquela parte do interior da Grécia. É esta estagnação a metáfora que o filme utiliza para nos antecipar o que logo se percebe no desenrolar da história.

Antígona (Marina Symeou) é essa mulher que volta à sua cidade depois de anos vivendo na capital Atenas. Ao descer do trem, um velho, única figura humana na plataforma deserta, pergunta se ela não cometeu um engano ao desembarcar ali. Ninguém desembarca naquela cidade, diz ele, pouco depois de avisar que uma tempestade estava a caminho. O velho, aqui, faz as vezes de oráculo.

Do nome da protagonista aos elementos que logo se apresentam, incluindo o fato elementar de ser um filme grego, não há dúvida sobre como a obra quer dialogar com a figura de Antígona, personagem da clássica mitologia grega cuja tragédia foi interpretada na peça escrita pelo por Sófocles, há 2.500 anos.

Entre as muitas interpretações desse mito, pode-se dizer que Antígona representa uma força feminina que se rebela contra o poder dos homens. Este é um paralelo que o filme faz, numa tentativa de sutileza para construir sua tragédia, mas que não oferece nada de muito sutil.

A sociedade que a Antígona do filme encontra não está simplesmente estagnada. Vive em num limbo de cinismo, covardia, omissão, acomodação e submissão. Um estado de letargia que é estranho à protagonista, tanto pela sua natureza contestadora como pela sua vivência cosmopolita.

Neste contexto, ela se vê incomodada com arbitrariedades e violências presentes na postura dos homens que detém algum poder na cidade. Um incômodo que ela estende sobre os outros que vivem lá, acomodados na inanição que permite o exercício desse poder machista e misógino.

Não se trata, contudo, de um choque o que ela experimenta em seu retorno. Ao menos não de imediato. Se o principal problema do filme é trabalhar com metáforas pobres em sutilezas, sua qualidade está em não promover o choque logo de partida. A construção desse enfrentamento leva tempo para surgir, e as relações que o filme estabelece já prenunciam a tensão.

Contudo, é na costura dessa tensão que mais se fragiliza a narrativa. Ao optar por uma montagem que adia informações na tentativa de criar suspense e curiosidade, o que se consegue é apenas desperdiçar o bom material explosivo presente na trama. Isso faz com que o crescente do agravamento da situação dos personagens só ganhe a dimensão de sua gravidade e perigo perto do fim.

Como não é incomum no cinema grego construir-se em torno do conflito velado entre o arcaico e o moderno, O Retorno de Antígona estabelece este conflito na independência que a protagonista exercita e no contraste disso com a quase nula independência dos demais personagens.

Nesta construção, o filme cresce nos minutos finais, quando a tragédia se aproxima. Mas é um efeito que não deixa de se apresentar diluído pelo caminho frágil que conduziu as coisas até ali, o que afeta não apenas o resultado final, mas a própria experiência da narrativa.
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Na kathesai kai na koitas
Giorgos Servetas
Grécia, 2013
98 min.

Trailer

 

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