sábado, janeiro 01, 2011

Meu Mundo em Perigo



Meu Mundo em Perigo
José Eduardo Belmonte
Brasil, 2007

A câmera permanece quase o tempo todo muito próxima. Acompanha os personagens, esquadrinha suas expressões, se aproxima de seus olhares. Essa proximidade asfixia, nos insere na angústia dos personagens, sufocados por suas obsessões. Esses personagens estão à procura de saídas, mas para isso encarceram-se dentro de si mesmos.

“Meu Mundo em Perigo”, terceiro longa-metragem de José Eduardo Belmonte, apresenta a desestruturação de vidas à partir de perdas e de ausências. Seus personagens não suportam o vazio súbito que surge em suas vidas e entregam-se a obsessões. Buscam algum conforto, alguma vingança, algum esquecimento.

Elias vê seu mundo desmoronar ao perder a guarda do filho para a ex-mulher. Em uma interpretação intensa, o ator ... desprende de seu olhar o quanto se sente perdido. É em meio a desorientação que ele mata um homem.

Fito é oprimido pela mulher e pelo pai que se envergonham de sua covardia. Dono de uma fraqueza que beira a estupidez, também vê sua vida desmoronar quando o pai é atropelado. Busca, a partir daí, uma vingança que se alimenta mais na promessa do que na possibilidade de realização.

Isis não fala. Comunica-se através de um bloco de anotações. Hospedada em um hotel no centro da cidade, também tem seu mundo desestruturado por ressentimentos. Isola-se em uma fuga artificial, como quem busca na solidão respostas para perguntas que ainda não formulou.

É através desses personagens que Belmonte nos leva a um universo sufocante, de sentimentos estranhos e confusos, de pessoas perdidas em rotas de colisão consigo mesmas.

“Meu Mundo em Perigo” é um filme de abismo. Seus personagens, mergulhados que estão no abismo de suas desestruturas, não enxergam nada em redor. Vivem num próprio isolamento, sentem pena de si mesmos, não vêem norte possível. Estão imersos, afogados.

Os efeitos que Belmonte aplica em sua narrativa se fazem pela proximidade da câmera, que não dá espaço a seus objetos de observação. A marca dessa opressiva proximidade está na seqüência de diálogos na ante-sala do tribunal, quando os personagens trocam palavras de aspereza, ofensa, intimidação, apoio, encorajamento, dissimulação e acusação. Todo esse trecho é filmado enquadrando apenas os lábios muito próximos dos rostos, numa conversa de pressão, de amedrontamento ou de intimidade. A força dessa seqüência é um dos pontos altos do filme.

Belmonte demonstra força em um filme intenso, coloca o expectador em contato direto com seus personagens, nos faz entrar em seu universo sufocante.

No final, o que se percebe é que esses personagens buscam uma reconciliação consigo mesmos, que sentem culpa e querem a redenção. Atravessam uma jornada no limbo e ensaiam a paz, o equilíbrio, o resgate. Mas o equilíbrio de um representa, obrigatoriamente, a queda de outro. Estão ligados, não apenas por terem seus mundos sob ameaça ou desmoronamento, mas pela tragédia. É a inevitabilidade do trágico que permanece com eles e sustenta o fio tensor da narrativa, levando-os ao encontro um do outro, inexoravelmente.

“Meu Mundo em Perigo” termina entrecortado, como se uma ruptura definitiva se repetisse. Talvez não haja redenção para os fracos. Nem silêncio que não termine.
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