sábado, fevereiro 25, 2012

Oscar 2012



Um amigo, mais rabugento que eu, costuma dizer que não se senta em uma mesa onde o Oscar esteja sendo discutido a sério. Se for apenas como amenidade, tudo bem. O Oscar, assim como a indústria que ele premia e representa, é entretenimento. Mas é também política, lobby, business. Quem quiser uma premiação que leve em conta o cinema como arte ou como algo além do entretenimento, que busque outra premiação – e, acredite, existem poucas no mundo fora desse esquema.

Isso não impede, porém, que alguns filmes indicados ou vencedores ao longo da historia da premiação não sejam realmente ótimos filmes. De qualquer forma, não ficar ligado ao evento e arriscar um e outro palpite é quase impossível para quem curte cinema. Por isso, o Eu, Cinema faz abaixo algumas observações sobre os indicados, levando em conta apenas as quatro principais categorias: Filme, Direção, Ator, Atriz. Naturalmente, nada muito sério, como convém a um prêmio que vale mais como glamour do que como cinema.


Direção:

Michel Hazanavicius, por O Artista: deveria levar por se sair tão bem em conduzir um filme mudo em pleno século XXI sem cair na monotonia. Sua direção é rica em recursos, que funcionam todos de forma azeitada para conduzir a narrativa com clareza, sentimento e emoção.

Alexander Payne, por Os Descendentes: sua condução da trama e a forma como equilibra com brilhante coerência o trágico humor das situações apresentadas o tornam um dos mais merecedores do premio deste ano.

Martin Scorsese, por A Invenção de Hugo Cabret: mestre reverenciado sem hesitação por qualquer cinéfilo, Scorsese se perdeu um pouco na direção do filme. Cheio de nobre e altas e verdadeiras boas intenções na homenagem que presta ao cinema, faz uma aventura com pouca a aventura, cuja primeira parte da narrativa é arrastada e travada. Mesmo assim, está entre os favoritos.

Woody Allen, por Meia-Noite em Paris: mais uma vez brilhante, Allen constrói seu filme como um artista que domina pincel, traços, cores e profundidade. O quadro que compõe é leve, mas de teor crítico. Tem uma suavidade e consistência que poucos diretores saberiam alcançar. Mas não deve levar.

Terrence Malick, por A Árvore da Vida: Malick não fez um filme, fez uma travessia. A forma como transforma, o modo como envolve, sua desarticulação do discurso cinematográfico linear para uma experiência de sentidos, mais do que de sentido; tudo isso o faz merecedor da premiação. Tem chances.


Melhor atriz(*):

Glenn Close, em Albert Nobbs: exemplar. Ela é o filme. Toda rigidez de sua personificação de um homem, a estranheza em gestos que representam um aprisionamento perene se amalgamam com a própria narrativa. Corre por fora.

Viola Davis, em Histórias Cruzadas: atuação sensível, mas um pouco previsível. Pode ser mais um Oscar para uma mulher negra (até agora só Halle Barry, por A Última Ceia, em 2002). Tem chances, mas a concorrência é forte.

Rooney Mara, em Os Homens Que Não Amavam as Mulheres: dificilmente leva. No filme, tem carisma e força, mas nada tão brilhante como algumas das concorrentes.

Meryl Streep, em A Dama de Ferro: forte candidata. Sua atuação como Margaret Thatcher impressiona desde as primeiras cenas, especialmente na fase debilitada pela idade. Uma interpretação memorável.

Michelle Williams, em Sete Dias com Marilyn: ainda não vi, mas as notícias que chegam é de que sua atuação faz mesmo a diferença. A atriz já vem há algum tempo mostrando talento,quem não viu precisa ver Namorados para Sempre, que também tem uma atuação brilhante de Ryan Gosling, outro injustiçado no Oscar desse ano, quand poderia ter sido indicado tanto por Drive quanto por Tudo Pelo Poder.

(*) – é preciso ressaltar uma das grandes injustiças deste ano nesta categoria. Tilda Swinton, por sua atuação em Precisamos Falar Sobre o Kevin, não podia estar de fora. Poderia, facilmente e com sobras, ocupar o lugar de Viola Davis ou Rooney Mara.


Melhor ator:

George Clooney, em Os Descendentes: disparado meu favorito. O equilíbrio sutil do filme de Payne se apoia exatamente na atuação encaixada de Clooney. Sem ele, seria outro filme.

Jean Dujardin, em O Artista: dança e sapateia muito bem. Tem grandes méritos por expressar-se todo o filme sem palavras e seduzir o público com seu carisma. Mas sua atuação cai um pouco para o óbvio na fase de queda de seu personagem.

Gary Oldman, em O Espião que Sabia Demais: está, sim, muitíssimo bem no papel. Seu recalcado e silencioso espião é um dos charmes do filme, mas não creio que seja para Oscar. A indicação é justa, se levar, deixa de ser.

Brad Pitt, em O Homemque Mudou o Jogo: tem histórico para estar na lista, mas no referido filme atua no automático. Sobressai seu natural carisma, mas não vai além disso. Por esse filme, não tinha que ser indicado.

Demián Bichir, em A Better Life: ainda não vi, mas li muitos elogios ao ator mexicano, muitíssimo conhecido e premiado em seu país.


Melhor filme:

O Artista: apesar do desempenho fraco de bilheteria que o filme vem tendo (o que mostra que o deslumbre entusiasmado da crítica não garante sucesso de público e que o preconceito contra um filme mudo ainda é forte entre o espectador mediano), o filme é muito bom e merece ser visto. A coragem de fazer um filme tão anacrônico, comparando-se esses tempos “idiotizantes” de banalização da tecnologia 3D, já valeria a indicação. Favorito ao prêmio, se levar fica em boas mãos, mas não é o melhor entre os indicados.

O Homem que Mudou o Jogo: é bom filme, mas não faz sentido figurar nesta categoria. Seu grande mérito é se passar dentro do universo do Baseball e mesmo assim ser inteiramente compreensível para nós, que não entendemos “lhufas” do esporte. Boa história, bem contada e com a chave-mestra escondida na relação pai/filha da trama, criando um arco muito sensível no fim da história. Mas daria para elencar uns cinco filmes muito melhores que ficaram de fora. Não deve levar.

Os Descendentes: meu favorito entre os indicados, ainda que o filme do Malick me deixe quase dividido. Mas este merece por ser um filme de qualidades simples, que se comunica fácil com o público, com emoção e sensibilidade, sem apelos dramáticos exagerados e com camadas sutis. Um filme brilhante e redondo em todos os aspectos. Tem chances.

A Árvore da Vida: está bem cotado. Merecia por ousar na forma e no conteúdo. Se peca por uma certa incomunicabilidade para quem não se entrega à experiência sensorial do filme, certamente entrega uma travessia de múltiplas interpretações. Provocador, nos livra de qualquer indiferença. Ame-o ou deixe-o (e vi muita gente o deixando). Mas é obra de lenta digestão, com uma fotografia de arrombar as retinas de tão bela.

Meia-Noite em Paris: brilhante análise crítica do saudosismo daquilo que não vivemos, um sentimento comum em boa parte dos seres humanos. Divertido, fascinante e encantador, o onírico ganha uma textura que só Allen poderia conceber, além de ser engraçado. Até Owen Wilson, de quem não gosto muito, se sai bem. Mas a concorrência, em vários aspectos, é dura demais. Não deve levar este ano.

História Cruzadas: típico filme de Oscar. Tem algumas chances. Mas é filme de personagens estereotipados, contaminado por um alienante maniqueísmo. Agrada ao público em geral, mas não tem nada de muito interessante, apenas uma história divertida, às vezes melodramática, com lição de moral no fim. Formatadinho para o prêmio.

A Invenção de Hugo Cabret: minha maior decepção. Culpa, claro, da grande expectativa gerada. Há quem se desmanche pelo filme, mas a mim só emocionou no terço final. Antes disso, foi um arrasto custoso. Mesmo com a maravilhosa homenagem a um dos “pais” do cinema como o conhecemos hoje e com o uso delicado e eficiente da tecnologia 3D, não justifica tanta reverência. Tem grandes chances.

Tão Forte e Tão Perto: com exceção da trama ter como um dos elementos propulsores da ação os atentados de 11 de setembro, nada mais justifica a indicação. É filme desengonçado, desesperado por emocionar, mas ineficaz em fazê-lo. Talvez funcione melhor no país que sofreu o trauma na carne, mas é obra um tanto forçada na busca de uma catarse que nunca se consolida.

Cavalo de Guerra: único não visto entre os indicados dessa categoria. Mas pelo que os colegas de crítica têm dito, não merecia estar nem entre os indicados.
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