segunda-feira, dezembro 27, 2010

Tetro



Tetro
Francis Ford Coppola
Argentina, EUA, Espanha, Inglaterra, 2009

“Tetro”, novo filme de Francis Ford Coppola, não vinga. É como se faltasse alguma liga, um último ingrediente, ou a recombinação dos ingredientes existentes. A sensação que fica é de que o filme chega bem próximo do limiar para se tornar uma obra inesquecível, mas em algum ponto, em algum momento, ou talvez na apreciação do todo, retrocede.

Passado em Buenos Aires, com uma excelente fotografia em preto e branco, o filme conta a história de Tetro (Vincent Gallo), um escritor que abandonou sua obra antes de publicá-la. Afastado da família, casado e totalmente integrado à vida da cidade, recebe a visita de seu irmão caçula, Benjamin (Alden Ehrenreich).


Com a chegada desse último vínculo com a família, Tetro se verá às voltas com o passado, com os segredos de família, confrontado consigo mesmo e com sua obra inacabada.

Coppola opta por impor a seu filme um tratamento de melodrama, no qual a música sempre presente emoldura sentimentos. O filme é sobre rivalidade, mas também sobre ressentimentos insuperáveis.

Na composição dessa história familiar, tema tão caro ao diretor, como atesta sua filmografia, Coppola corre grandes riscos. Cria uma narrativa de andamento irregular, com situações que flertam, muito sutilmente, com o realismo fantástico da literatura latino-americana. Mas mesmo nisso não passa de uma superfície, muito mais de homenagem que de referência.

Com personagens inusitados, seja pela estranheza aparente ou estranheza interna, o filme constrói seu universo sobre esse estranhamento. Apresenta uma realidade muitas vezes pouco ortodoxa. Personagens como a “super” crítica Alone (Carmen Maura), ainda que de pouca participação, exerce sobre a trama uma relevância desconcertante e misteriosa.

No conjunto, “Tetro” se mostra uma obra ingênua, de pouca força dramática, apesar de todo o elenco estar ótimo em seus papeis, com destaque para a atriz Mirabel Verdú, que faz Miranda, esposa de Tetro. Mas isso não basta para levantar o filme.

No entanto, apesar dos bons ingredientes não funcionarem a contento para tornar o filme uma obra concisa, com rosto, corpo e alma (tem bem mais alma que corpo e nenhum rosto), uma coisa não se pode deixar de elogiar e atestar. Aos 70 anos, Coppola, um diretor de obra sedimentada numa qualidade incontestável e que poderia estar acomodado em fórmulas para repetir o mesmo, arrisca-se como um garoto num projeto ousado, tão ingênuo quanto juvenil.

Se “Tetro” não funciona como experiência dramática, nem como abordagem temática, é graças à coragem de seu diretor em correr riscos. Para um gigante do cinema, que já foi tão longe em sua arte, é sempre louvável e digno de aplauso sua disposição em correr riscos, em rejuvenescer-se, em reinventar. Mesmo que não dê certo, vale o risco e a coragem.

“Tetro” ficará com essa marca, a marca de um diretor que quis voltar a ser jovem, errou, mas não desaprendeu. “Tetro”, de forma alguma, ficará esquecido na filmografia do diretor. Mas se não alcança os melhores momentos, certamente não desmerece em nada o conjunto. Falta liga, sim, mas há em suas cores monocromáticas um tom de juventude e ingenuidade que quase o torna bom.
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