segunda-feira, novembro 15, 2010

Senna


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Senna
Asif Kapadia
Inglaterra, 2010
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Quando lidamos com homens que se tornaram ídolos, que alcançaram um patamar que ultrapassa os limites dos mortais, sempre vai existir o polêmico, o duvidoso, o incerto. São esses elementos que tornam as pessoas – sejam ídolos ou não – interessantes. É o multifacetado de cada um que torna cada pessoa única, independente em sua grandeza. Por isso, qualquer biografia séria tem a obrigação de buscar isso, a múltipla e complexa pessoa que há em cada um de nós.

No documentário Senna, lançado esta semana nos cinemas, o diretor inglês Asif Kapadia opta por uma estrutura simples, direta e convencional. Ao retratar a carreira do piloto, desde sua primeira temporada até o acidente fatal em 1994, o faz com uma rara superficialidade, de forma que mesmo a trágica morte e a perda que ela significou não cause grande comoção na tela.

E melhor que não comova mesmo, pois dentre as muitas possibilidades de abordagem da vida desse mito do automobilismo uma das mais desprezíveis seria através do apelo fácil à comoção que sua morte causou.

O problema maior do filme está em sua perspectiva simplista e unidimensional de um personagem que era tudo, menos prosaico como personalidade. Da forma como está, o filme não acrescenta nada à biografia do piloto, como também não proporciona um mínimo de experiência emocional durante sua exibição.

Ayrton Senna da Silva foi mais que um piloto extraordinário, realizador de grandes feitos até hoje insuperáveis - e não falo aqui de números e estatísticas. Foi uma personalidade que afetou o meio em todos os lugares por onde passou. Foi, como na letra de Caetano Veloso sobre Alexandre, o Grande, magnânimo e cruel. Sua condição de ídolo, ampliada pelo efeito midiático pronto a exaltá-lo sem confrontação, muitas vezes ocultou sua personalidade difícil, ultracompetitiva e, em alguns momentos, até desleal.

Nada disso seria capaz de diminuir sua importância, seu talento, sua genialidade. Mas parece que a morte santifica e por conta da tragédia de que foi vítima é como se quisessem apagar o homem e lembrar só do mito.

Assim, o filme de Asif Kapadia  incorre em superficialidades que acabam até por diminuir o tamanho do documentado, comprometendo a compreensão de sua verdadeira grandeza para o esporte.

O filme passa por sua carreira de forma panorâmica e superficial, não mostrando sequer grandes confrontos em corridas, ultrapassagens históricas e momentos que seriam indispensáveis para a construção e dimensionamento do verdadeiro tamanho de Ayrton. Além disso, trata o personagem como alguém unidimensional, não lhe dá profundidade. Abstém-se de escrutinar por trás da máscara de bom-mocismo, de exemplo para uma nação, e revelar não um vilão, mas um homem, passível de destemperos, equívocos e fragilidades humanas.

A única perspectiva que o filme ressalta de forma até exagerada - e consequentemente distorcida - é a inimizade com o arquirrival Alain Prost. Sob a ótica do filme, Prost, associado a forças do mal geridas por Jean-Marie Balestre, então presidente da FIA (Federação Internacional de Automobilismo), é o grande vilão da história; o piloto de talento inferior que tenta “sabotar” e desestabilizar Senna. É uma forma não apenas limitada, mas, pior, maniqueísta de contar a história. Até porque Senna tinha ainda outro inimigo: ele mesmo e seu temperamento difícil.

Ao pautar todo o filme por uma rivalidade que de fato existiu, mas que representou apenas parte de um todo muito maior; ao dar ao personagem de Senna uma unidimensionalidade limitadora e apequenada quando comparada com a verdadeira importância de suas conquistas e de suas batalhas, dentro e fora da pista, o filme de Asif Kapadia resulta numa experiência empobrecedora e tacanha.

Já li críticas que dizem que é um filme para fãs. Discordo. Não serve aos fãs, pois não o dimensiona como esportista genial, não dá mensuração do caminho duro e das passagens que construíram o mito. Também não contribui como fonte de informação para novas gerações no aprendizado de quem foi e o que representou Ayrton Senna, pois apresenta um material fácil de ser achado e até confrontado nos meios multimídias disponíveis hoje. Não constrói uma narrativa, mas apenas um recorte borrado. Muitos documentários televisivos de 30 minutos já disseram mais sobre Senna do que este filme.

Senna, o filme, termina por servir apenas como um entretenimento superficial. É um filme que poderia ser grande se desse ao personagem uma dimensão real e profunda, mas que por fazer justamente o contrário, torna-se um filme pequeno e sem importância diante do verdadeiro personagem que falha em retratar.
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1 comentários:

AnA disse...

Só quero saber se o Rubinho Barrichello aparece nesse tal filme, porque senão nem gasto meu tempo e dinheiro. Nunca fui "viúva" do Airton Senna.

Diz aí, mano!
E o Rubinho tá ou não tá?

Abraço!

 

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