Vencedor do último Festival de Berlin, Instinto Materno também foi a aposta da Romênia na disputa por uma
vaga entre os indicados para Oscar de filme estrangeiro. Não ficou entre os nove
finalistas, dos quais cinco serão, de fato, indicados a concorrer. Mas, para
muita gente, ganhar Berlin faz do filme muito mais Cinema (com “C” maiúsculo)
do que levar um Oscar.
De fato, Instinto
Materno merece ser levado como cinema maiúsculo. O filme revela em sua
narrativa algo semelhante ao que o filme brasileiro O Som ao Redor revelou sobre a sociedade local. Mas sua importância
extrapola a localidade, porque o mal que ele desenha a respeito da Romênia
pertence à quase todas as sociedades: as assimetrias das relações entre
diferentes classes sociais.
Mas a comparação com o filme brasileiro deve parar por aqui.
Porque se nesta construção o filme romeno é menos complexo, também acaba sendo
mais contundente num primeiro momento. Não precisa, como o outro, de tempo para
que as linhas sutis se tornem nítidas. É direto sem ser óbvio e seus
desdobramentos nos atingem com força imediata.
O cenário é simples. Filho de uma família rica atropela e
mata filho de uma família pobre. A partir dessa tragédia entra em jogo o poder,
a influência, mas, principalmente, o olhar desumanizado de uma classe sobre a
outra.
No entanto, o diretor Calin Peter Netzer não transforma a
questão em um embate. O filme mantém seu olhar, na maior parte do tempo, dentro
da família rica, revelando sua intimidade e suas fraturas. Ali, tudo orbita em
torno da mãe, Cornelia (Luminita Gheorghiu), a matriarca controladora.
Barbu (Bogdan Dumitrache), é o filho, marmanjo para lá dos
30, que mantém contra a mãe uma rebeldia de almanaque, daquelas que dispara
ofensas, mas não abre mão do dinheiro e da vida confortável. Neste caso, morar
sozinho, ter seu carro e namorar uma garota que a mãe não aprova passa longe de
ser alguma independência. Não passa de um fetiche ilusório de filho mimado.
Mas é Cornelia, na interpretação de Gheorghiu, a força do
filme. Suas queixas contra o filho são uma falsa fragilidade que desaparece na
hora de mandar no marido bundão, na hora de comprar uma testemunha, na hora de
fazer o que for possível para livrar o filho da prisão. Nesta sua ação, deixa
entrever a forma como se dão as relações sociais de classes. Isso está no modo
como fala com a faxineira, como se impõe aos policiais e também ao tratar com a
família da criança atropelada.
Assim, Instinto
Materno mostra-se um drama de classe que desnuda na sua entrelinha relações
de poder. Espanta, enquanto filme de uma cultura distante da nossa, como os
tipos apresentados são comuns e reconhecíveis. Daí sua universalidade, ao
mostrar a universalidade da discrepância entre classes. Mas também o estereótipo
comum e incrivelmente irritante da mãe superprotetora e do filho mimado, boçal,
incapaz de assumir as consequências de seus atos.
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Pozitia copilului
Calin Peter Netzer
Romênia, 2013
112 min.
Trailer
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