A certa altura de O
Futuro, num gesto de pequeno desespero, o jovem Jason (Hamish Linklater)
faz o tempo parar. Ao fazê-lo, impede que Sophie (Miranda July) diga algo que o
vá machucar irremediavelmente. Depois de um tempo, sem saber se o tempo ficou
parado por alguns minutos ou por dias, não consegue mais fazê-lo retomar o
curso. Mas sabe que não pode parar o tempo para sempre.
Escritora, artista plástica e performática, roteirista,
diretora e atriz, Miranda July se lança pela segunda vez na direção de um
roteiro de sua autoria. O primeiro, Eu,
Você e Todos Nós (2004), deu à ela o Camera
d’Or no Festival de Cannes em 2005, prêmio destinado a diretores
estreantes, além de mais de 15 prêmios em outros festivais. O sucesso colocou
July entre os nomes mais promissores do cinema independente.
Poética e estranhamento parecem ser o material preferido
pela diretora para compor seus filmes e seus personagens, estes últimos sempre
deslocados no mundo. Em O Futuro, a
diretora aborda o relacionamento de um casal pela perspectiva do tempo e da
dissolução natural que ele trás. Porém, sua forma passa longe de abordagens
convencionais, fazendo de metáforas e signos o material da narrativa.
O fator que desencadeia os eventos da história trata da
adoção de um gato portador de uma doença terminal. A imensa responsabilidade de
abrigar um animal em seus últimos meses de vida afeta a perspectiva de ambos
sobre o tempo. Essa lógica particular do casal é exasperada quando descobrem
que houve casos em que animais na mesma condição, por terem sido bem cuidados,
chegaram a viver por cinco anos.
O que era um compromisso de meses torna-se para eles uma
possibilidade de anos. Na quase paranoica visão do casal, eles teriam já 40
anos depois disso, o que significa ter quase 50, que por sua vez seria já quase
o fim da vida. Como eles têm apenas um mês antes do gato ser realmente liberado
para ser adotado, encaram esses trinta dias como os últimos de suas vidas e
passam a vivê-los sob essa perspectiva.
Tempo e compromisso está na base dos desdobramentos que o
filme passa a narrar. Nem sempre lineares e nem sempre fáceis de serem entendidos.
Da amizade de Jason com um velho casado há 50 anos até o relacionamento de
Sophie com um homem mais velho, toda lógica narrativa do filme será composta
por uma construção repleta de elipses que oscilam entre o onírico e o insólito.
Essa composição, que acena com o fantástico, faz de O Futuro uma fábula melancólica sobre a
solidão e sobre o tempo. Daí que quando Jason não consegue fazê-lo se mover, a
metáfora pode ser na verdade inversa, representando nossa impossibilidade de
fazê-lo parar.
Poeticamente desconcertante, O Futuro pode parecer num primeiro momento um filme sem muito
sentido, ou demasiadamente permeado por metáforas. Porém, mais importante que
entender a lógica de sua engrenagem, cabe perceber sua atmosfera lúdica sobre a
confusão dos sentimentos quando o tempo age sobre eles em uma relação. No caso
de Jason e Sophie é como se o amor sempre se desgastasse, mas nunca morresse de
fato.
Ao final, pode restar uma incompreensão do que tudo aquilo
representa. Mas é o tipo de filmes do qual é possível se gostar sem saber por que
se gosta. Parte desse efeito está na performance das atuações e no modo como
July constrói seus planos e suas cenas. Mesmo na mais insólita delas,
percebe-se que há uma sinceridade despojada, que mesmo sendo feita de
complexidades, é mostrada com uma sofisticação simples e um sentimento amplo
não apenas coerente dentro do filme, mas principalmente cativante dentro do
olhar sensível da diretora.
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The Future
Miranda July
Alemanha/EUA, 2011
91 min.
Trailer
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