“É como nos anos 60, mas com menos esperança”, diz Justin
Bond diante da sala repleta de pessoas fazendo sexo em todas as combinações
possíveis. Há nesta frase um toque de melancolia. Não em relação ao sexo e ao
prazer que se busca naquela sala, mas em relação a ter de buscá-lo tão
secretamente. Se nos anos 60 o sexo livre tinha algo de libertário e até de
ingenuidade, nos anos 2000 ele pode ser um refúgio da contraliberdade dos
tempos vigiados, sem ideais de mudar o mundo, mas com a simples proposta de se
sentir livre de verdade.
Isso porque há algo de aprisionamento nos distintos sentimentos
que ligam os personagens desta história. Em uma Nova York moderna, pessoas
buscam a satisfação que as liberte, mas muitas vezes não sabem onde está a
saída para esta liberdade. É essa angústia velada que as levarão a se
encontrarem no Shortbus, um lugar no qual nada é censurado, desde que realizado
com afeto e sinceridade.
Sofia (Sook-Yin Lee) é uma terapeuta sexual casada com Rob
(Raphael Barker), um sujeito pacífico e sintonizado com o modo de vida zen da
esposa. Mas Sofia tem um problema que a atormenta. Ela não consegue ter
orgasmos. Nunca. E teme dizer isso ao marido com receio de ferir seus
sentimentos.

Há ainda a dominatrix Severin (Lindsay Beamish), que atende
clientes ávidos por serem subjugados, espancados e humilhados. Ela, no entanto,
sente dificuldade em se relacionar com pessoas e sua satisfação sexual só
ocorre de forma solitária.
No cruzamento das histórias, que terão no Shostbus seu ponto
em comum e a subsequente irradiação e desdobramento, pode-se prever um filme
esquemático de desfecho óbvio. E embora parte dessa previsão se confirme, o
modo como o diretor John Cameron Mitchell (do ótimo Reencontrando a Felicidade) conduz sua narrativa passa ao largo do
esquemático. Sua fluidez até começa travada, como são seus personagens, mas
logo o filme desliza suavemente, nos proporcionando delicados momentos de catarses
íntimas.
Mesmo que seus dramas sejam dramas superficiais travestidos
de algo mais profundo e que muitas respostas para esses dramas sejam simples e
óbvias, o filme consegue criar uma atmosfera que une perturbação e
sensibilidade. Seus personagens são carismáticos, conectados com o público, de
fácil entendimento e empatia. E isso é algo difícil de se conseguir com
histórias e sexualidades tão diferentes para os padrões caretas do nosso tempo.

Se há menos esperança no desafogo da liberação dos
frequentadores do Shortbus, também há menos ingenuidade. É o que revelam as
palavras de um personagem ao afirmar que antes queria mudar o mundo, agora quer
apenas sair dele com alguma dignidade. Esta dignidade talvez não diga respeito
a como os outros nos veem, mas como nos sentimos sobre nós mesmos.
--
Shortbus
John
Cameron Mitchell
EUA, 2006
101 min.
Assista ao
trailer
0 comentários:
Postar um comentário