A Separação é um filme que pulveriza maniqueísmos. A forma como o filme desenvolve e problematiza dois lados de uma contenda nos coloca perplexos diante da impossibilidade de tomar partido. Seus personagens têm uma dimensão humana tão próxima da verdade que ao mesmo tempo que nos solidarizamos com todos sabemos também que todos estão errados.
Como em qualquer separação, há os dois lados. Mas nesta obra do diretor iraniano Asghar Farhadi, os lados vão além do casal cuja separação trata o título. Isso porque a tal separação é apenas estopim para uma série de equívocos e mal-entendidos a partir dos quais duas famílias se verão clamando por justiça.
Simin (Leila Hatami) e Nader (Peyman Moadi) querem o divórcio. Mas o juiz nega-lhes a separação. Argumenta que os motivos não são suficientes e que não há comum acordo entre eles para que se separem. Simin quer sair do país e quer que o marido e a filha a acompanhem. Nader se recusa a ir porque tem de cuidar do pai, que sofre de Alzheimer. Ela então deixa a casa em que vivem. Termeh (Sarina Farhadi), filha de 11 anos do casal, decide ficar com o pai, porque acredita que sua mãe vá regressar.
É quando Razieh (Sareh Bayat) e sua filha de seis anos entram na história. Ela é contratada por Nader para cuidar do pai enquanto ele trabalha. Mulher religiosa, seguidora das determinações do islamismo, Razieh está grávida de cinco meses e com o marido desempregado. Mas ela logo vê que cuidar de um idoso tão debilitado está além de suas forças, além de possíveis complicações com sua fé.
A dificuldade financeira de Razieh, sua gravidez, o marido endividado e outras questões urgentes a levam a cometer um erro. A separação da mulher, o pai doente, uma situação estressante levam Nader a cometer outro.
O resultado será julgamentos precipitados, atitudes impensadas e uma perda irreparável. Começa então um inferno em espiral na vida das duas famílias. Um inferno repleto de acusações, culpas negadas, medo, vergonha e desamparo.
Na intensificação desse inferno, o filme tem momentos de incessante aflição, quando seus personagens se veem em circunstâncias tão complicadas quanto constrangedoras. É onde o diretor trabalha a empatia do público, alternando-a entre os dois lados da contenda. Assim, o filme se lança nos limites de certo e errado, justiça ou injustiça, mas apagando o tempo todo esses limites, revelando o quanto podem ser frágeis. É cinema de vida real, intensificada na tela quase sem respiro, mostrando a natureza humana naquilo que é mais humana: o erro.
Em meio a isso fica o espectador, rendido não apenas pela riqueza de elementos indefinidores do certo e errado, mas também pela empatia com o drama de todos os envolvidos. Com isso, A Separação dissolve qualquer maniqueísmo e nos deixa prostrados diante de dramas entrelaçados pela mentira ou por verdades imperfeitas.
Tudo isso faz de A Separação um filme sobre a condição humana em seu aspecto menos nobre, quando se quer a razão diante do erro. É um filme sobre culpa, arrependimento, mas também desamparo. Tudo trabalhado com uma justeza sem espaços para respiros, uma imersão quase claustrofóbica no agravamento gradual de uma crise cuja solução parece não existir.
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Jodaeiye Nader az Simin
Asghar Farhadi
Irã, 2011
123 min.
Trailer
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