segunda-feira, dezembro 03, 2012

Holy Motors









Se você não assistiu a Holy Motors, então não tem a menor ideia do que se trata esse filme. E se você já assistiu, provavelmente continua sem ter a menor ideia. Treze anos depois de seu último longa (Pola X, de 1999), o diretor francês Leos Carax apresenta agora um trabalho inclassificável. Uma impossibilidade de rótulo e de gênero que pode tanto servir ao elogio máximo como à crítica mais demolidora.

Pode-se amar Holy Motors ou abandoná-lo antes da metade. Isso porque o filme apresenta uma caótica e aparentemente desconexa proposta, de difícil digestão. Para seguir adiante, após o choque insólito, é precioso se permitir o prazer de não entender, o prazer de sair do cinema montado na incerteza. Sem isso, nada feito.

Também é necessário se permitir viajar a cada nova história não contada por inteiro. São as quase-histórias do filme, mas exibidas e construídas com um vigor e sensibilidade estética raros.

Não há uma trama em Holy Motors. Há apenas o dia de um homem que não se sabe quem é e que transita por Paris a bordo de uma limusine e que ao longo do filme se transformará e viverá diversos personagens. Cada um deles com a devida e necessária intensidade.

Entre muitas figuras desconcertantes, temos um louco que sai do esgoto para seduzir uma modelo encarnada por Eva Mendes com uma lambida no sovaco, logo após arraçar a mordidas dois dedos de uma assistente de produção. Temos um encontro melancólico de memoração do passado, além de um pai entristecido pela mentira da filha, e também um magistral interlúdio ao som de acordeões. Outras histórias se revezam, muitas falando da morte ou do ressurgimento. Assim nos atravessa Holy Motors.

Violência, miséria, rancor, absurdo, tecnologia, frustração. Há de tudo um pouco na jornada de um dia desse personagem, que são muitos personagens. São as muitas faces de Oscar, interpretado aqui pelo excelente Denis Lavant. O sentido dessa jornada, ora efusiva e estonteante, ora melancólica e filosófica, pode até se perder nas entre-tramas que se sucedem, nos encontros e desencontros programados sabe-se lá por quem e para quê.

Num mundo tão ávido por sentido, símbolos e significados, no qual o cinema comercial é tão mastigado que dispensa até que se olhe para a tela, um filme cujo sentido não está tão facilmente ao alcance da mão é absolutamente necessário. Goste-se ou não dele.

Mas muito pouco disso seria válido não fosse a acurada câmera de Carax. O diretor constrói sobre o nada climas de um onírico realista, uma espécie de sonho sem metafísica. Impõe ao filme ritmo, cores e atmosferas que destacam uma assinatura vigorosa e marcante.

Não gostar de Holy Motors é parte do jogo. É até mesmo a essência do cinema, que nunca foi feito – e bom que seja assim – de unanimidades. Pode-se até desprezá-lo ou abandoná-lo ao meio, mas não é possível vê-lo sob a máscara do impassível.

Não se abandona este filme por tédio, mas talvez por desesperança. A desesperança de ver algum sentido. Mas o sentido pode ser buscado após, ou na releitura, ou até mesmo inventado. O que Carax nos proporciona é a oportunidade de escavar esse sentido. Um sentido talvez oculto no leque de caminhos que se bifurcam, como um Borges ou um buraco de Lewis Carrol.

Entender ou não é o de menos. Holy Motors tem em si algo de essência cinematográfica, uma essência que tem escorrido por ralos de mediocridade, afetação e superficialidade. A essência da jornada, da experiência, da provocação, do estímulo ao pensamento e, principalmente, do estímulo aos sentidos. Pode até não significar nada, mas é um nada mais pleno do que muito estofo vazio que se vê por aí.
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Holy Motors
Leos Carax
França/Alemanha, 2012
115 min.

Trailer

1 comentários:

ADU VERBIS disse...

O filme Holy Motos é um destes filmes que mostra que o cinema agoniza, mas tá longe de ser sepultado.

 

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