Ás vezes é preciso tirar o espectador da letargia das narrativas clássicas. Para isso, é preciso ousadia, gosto pelo risco. Rodrigo Moreno demonstra essa ousadia em Um Mundo Misterioso, pois se arrisca a incomodar o espectador. Um incômodo que surge quando o filme renega alguns elementos narrativos confortáveis a que estamos condicionados. No lugar, entrega uma desestrutura na qual o conflito, o objetivo e a trama dão vez a um dialético vazio.

Boris (Esteban Bigliardi) e Ana (Cecilia Rainero) são um
casal de namorados que moram juntos. Até que ela pede um tempo. Desconcertado,
Boris se muda para um hotel e passa a vagar num limbo existencial. Não parece
ter objetivo, vontade ou mesmo empecilho para que seu limbo exista sem culpa ou
incômodo. Mas Boris se move. E ao mover-se transita entre situações de apatia,
mas que trazem no seu íntimo algum relevo de vida, natural em alguns momentos,
insólito em outros.
Como na sequência da festa, em que a trilha sonora suspende
a realidade. Boris troca diálogos nonsenses, experimenta a vagueza da noite,
conhece estranhos, perambula. Não há tristeza, arrependimento ou euforia. É
apenas um homem em si mesmo, sem adereços e sem encantos. Apenas um homem.
De fato, a partir de certo ponto, nada acontece em Um Mundo Misterioso. Vagamos pelo filme
com a mesma despretensão que vaga Boris, até que este volta ao ponto em que
começamos. Regressa depois de sereias, vazios, aventuras ocas de ação, mas
cheias de um “algo mais” menos óbvio que o cotidiano. Como um Ulisses
desmascarado e inerte, fuma, ouve uma canção na vitrola e sente-se novamente em
casa.
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Um Mundo Misterioso
Rodrigo Moreno
Argentina, 2011
107 min.
Trailer
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