domingo, agosto 10, 2014

The Rover - A Caçada

The Rover pode parecer num primeiro momento um filme pós-apocalíptico. Mas não é. Ao menos não no sentido mais comum do gênero. Isso fica claro na mensagem que abre e situa sua história: “Dez anos após o colapso”. Mas qual colapso? A resposta não vem mastigada. Pistas ao longo do filme salpicam referências. O colapso, podemos deduzir, foi econômico. O efeito, devastador.

É assim que surge na paisagem árida o rosto de Eric (Guy Pierce). Nele há a mesma aridez, e nos olhos o traço da leve insanidade de quem já não guarda ilusões. Quando seu carro é roubado por três sujeitos em fuga, começa a caçada, que ele empreende com uma violência e obstinação que não entendemos logo.

No caminho, a coincidência. Esbarra em Rey (Robert Pattinson). Ferido a bala e deixado para trás por seu irmão, Rey se torna refém de Eric quando este descobre que o irmão que o deixou para trás é um dos sujeitos que roubou seu carro. E Rey sabe para onde eles foram.

Se os filmes pós-apocalípticos surgiram como reflexo do medo causado pelo horror da guerra nuclear, numa representação do risco da degeneração da sociedade organizada causada pelo caos, o diretor australiano David Michôd apresenta o medo do horror econômico.

Mas neste horror criado por Michôd não há qualquer articulação ou discurso. Tudo é apenas efeito e a causa importa pouco. Resta somente o grande nada, um deserto moral tão vasto quanto o físico e tão violento quanto o vazio humano.

Assim, a trama é menos que um fio de lógica e o único arco dramático é a rarefeita relação entre Eric e Rey. E se neste embate dramático Guy Pierce atua intensamente fazendo de seu personagem um dique sempre prestes a romper, Robert Pattinson surpreende em uma atuação impressionante de violenta fragilidade.

Pattinson consegue dar corpo, voz, olhar e retardo mental a seu personagem de forma a realizar algo que muitos apostavam que não conseguiria: apagar inteiramente a imagem do “vampiro caviar” da Saga Crepúsculo. Sua atuação é simplesmente desconcertante e parte do efeito que o filme nos causa vem do que Pattinson realiza na tela.

Em um cenário em que a desesperança é o elemento principal, The Rover é marcado por cenas capazes de conectar o público a uma forte tensão, daquelas que nos gruda à tela. Violento e direto, o filme cria parte de sua narrativa na paisagem desolada e em figuras igualmente desoladas. No seu desenrolar, gera um tipo de desconforto que nos invade e não se resolve com o desfecho.

Na travessia que se constrói na tela, a mensagem final não é de esperança ou de transformação. É o mesmo vazio árido de sempre, é a sensação permanente de cavar em chão pedregoso e não encontrar sentido em nada. É o grande deserto do ser humano, aquilo que resta quando toda fachada sucumbe ante algum colapso, seja econômico ou não.
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The Rover
David Michôd
Austrália/EUA, 2014
103 min.

Trailer

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