O
diretor britânico Paul Greengrass é um ótimo artífice da montagem como
ferramenta para criar tensão. Mas não parece ter ainda desenvolvido a
habilidade de dar dimensão dramática a seus personagens.
Sua
qualidade como artesão de thrillers
está comprovada em filmes como A
Supremacia Bourne, o Ultimato Bourne
e Voo 93. Neles, Greengrass mostra
saber muito bem como controlar o ritmo das imagens para criar suspense enquanto desenrola a ação. Com sua técnica, faz crescer a expectativa a cada cena, prendendo
o público numa vertiginosa onda de cortes que picotam toda a ação para dar a ela um
tom de urgência e asfixia.
Não
é diferente em Capitão Phillips,
filme que, estrelado por Tom Hanks, se baseia numa história real envolvendo um
navio cargueiro da marinha mercante dos EUA e piratas somalis. Hanks é o
capitão do título que terá seu navio invadido e acabará vítima de uma situação
extrema de medo e desespero.
Naquilo
que é bom, o diretor é ótimo. Mas uma história como a de Capitão Phillips talvez exigisse habilidades que ainda faltam a
Greengrass. Pois se o filme funciona muito bem como thriller, seu natural aspecto dramático fica um tanto na
superfície.
Isso
não ocorre, porém, por culpa do elenco. Pois se, além do suspense, há outro bom
motivo para ver o filme, este motivo é o desempenho dos atores. Do veterano Tom
Hanks até o mais que convincente desempenho do elenco somali – todo ele amador –,
é a força das atuações que sustenta o circo de Greengrass.
Esta
sustentação encontra sua melhor qualidade no arco dramático que sugere a figura
de Muse (Barkhad Abdi), líder dos piratas. Mas sugere apenas, justamente porque
o filme está sempre mais preocupado em gerar tensão do que em dar dimensão ao
drama de seus personagens.
Isso
não enfraquece seu resultado naquilo que se propõe, mas deixa algo como um ruído entre o drama natural
da história e seu desenrolar com foco em um resgate orquestrado pelas forças
especiais da marinha norte-americana. Nisso, o casamento entre a tensão e o
drama não se equilibra bem.
Já
no seu início, o filme insere uma proposta que abandona sem desenvolver. Um
ótimo diálogo entre Phillips e sua esposa sobre os filhos – que estão entrando
na vida adulta – e sobre o mundo que vão encontrar contrasta com a cena a
seguir. Toda a gravidade que identificamos nas preocupações de Phillips é posta a prova quando o filme vai para a costa da Somália e revela outro mundo. O
mundo de Muse.
É
o encontro desses dois mundos, por meio da ação de pirataria e sequestro, a
aparente proposta dramática que sustentaria a ação. Mas isso fica no meio do
caminho, com apenas alguns breves lampejos desse conflito de “mundos”, que
daria ao filme um estofo que ele até parece querer ter, mas definitivamente não
tem. Pois é nisso que Greengrass se mostra mais fraco.
Entre
outros motivos, porque este é um diretor muito mais visual do que sutil. A
questão da proporcionalidade que o filme trabalha na imagem prova isso. O
desequilíbrio entre os dois “mundos” é mostrado visualmente na desproporção de
tamanhos e forças. Seja do pequeno barco somali ante o imenso cargueiro, seja
dos esquálidos piratas ante a bem nutrida tripulação, ou a ainda mais evidente desproporção
entre quatro piratas somalis e o poderio militar dos EUA.
Ainda
assim, Capitão Phillips é um
eficiente thriller que mantém o
espectador tenso, elevando o grau de tensão de forma constante. Na sua
estrutura dramática, mesmo com suas fragilidades, tem o mérito de reduzir
bastante o maniqueísmo típico de filmes em que as forças armadas dos EUA
representam a “cavalaria” salvadora. Há na sua elaboração contrapontos interessantes que matizam suas cores, reduzindo certezas pétreas sobre o que é maldade e vilania e o que é apenas desespero.
Graças
às excelentes atuações, é possível uma forte empatia com o protagonista sem que
isso anule uma também empatia com seus algozes, em especial com Muse. Essa
baixa voltagem de maniqueísmo, somada à competência do filme em produzir
tensão, fazem de Capitão Phillips um
filme que merece ser visto.
--
Capitain Phillips
Paul Greengrass
EUA, 2013
134 min.
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