Fausto, de Aleksandr Sokurov, é exigente com o espectador. Passar por suas duas horas e vinte minutos exige empenho e esforço. Mas o difícil em Fausto não se constitui de enigmas ou de experimentalismos confusos. Não há quebra-cabeças em sua narrativa linear, não há conexões sofismadas na sua estrutura. Tudo que quer dizer é dito; está ali, ao alcance de todos, velado apenas com a sutileza inteligente da grande arte, mas sem truques.

Completa esta angústia o fluxo ininterrupto de pensamentos do protagonista, somada à fala provocativa e sedutora da encarnação do demônio que acompanha o desiludido herói pelas ruas de um mundo desordenado, repleto de aflições do espírito e distorções da carne.

Sem recursos e sentindo-se tão vazio de saber como quando começou, vai a uma casa de penhores para trocar seu último anel por algum dinheiro. Mas o agiota, de grotesca aparência e inconfundível perversidade, recusa a joia. No entanto, não deixar de oferecer ao desiludido homem sua companhia por um passeio pela cidade, no qual a sedição do espírito será o verdadeiro penhor dessa relação.
Vai-se então ao assassinato gratuito, à assinatura dos termos de posse da alma, à obsessiva atração pela donzela, à descida ao inferno sem volta, e a um apoteótico esmagamento das esperanças. Fausto é uma desalentadora viagem pela consciência do homem, um retrato opressivo de nossa moral disforme.
No percurso, os símbolos. A estreiteza de passagens na qual corpos se espremem traz um sentimento de desconforto da alma, da nossa própria estreiteza ante as possibilidades inalcançáveis de quem busca o absoluto, sempre insatisfatório, como é o caso do poder. Espelho da mentira, da corrompida natureza da ambição, são também as propositais distorções que as imagens sofrem durante a projeção. Um recurso que conduz nosso olhar para uma realidade menos óbvia.

Se é desnecessário dizer que trata-se de um filme longe de qualquer facilidade comercial, cabe reforçar que tampouco é obra de mecanismos ocultos e oblíquos. A disposição de seu desafio é transparente, apenas sua dinâmica é volumosa, densa. Seu peso é o da iniquidade humana, tão comum e rotineira quanto assustadora, triste e difícil de carregar. Fausto, de Sokurov, não é fácil nem difícil, apenas intenso e assombroso.
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Faust
Aleksandr Sokurov
Rússia, 2011
140 min.
Trailer
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