Medianeras
Gustavo Taretto
Argentina/Espanha/Alemanha, 2011
95 min.
“Medianeras”, que
entrou em cartaz neste final de semana, expõe em sua abertura uma curiosa
relação entre a cidade de Buenos Aires, sua arquitetura desorganizada e a
solidão das pessoas. No final dessa abertura, quando o narrador enumera alguns males
do nosso tempo - como o estresse, a violência, o suicídio, a depressão - e
ilustra cada um deles com a imagem de um edifício correspondente, temos a
impressão de que realmente somos moldados pela cidade que habitamos.
Conhecemos então Martín (Javier Drolas). Isolado em seu pequeno
apartamento, ele trabalha como web designer e pouco sai de casa. Martín sofre
de algumas neuroses, tem medo de elevador, ataques de pânico. Em tratamento, sai
de casa apenas para ir ao psicanalista, fazer natação ou levar o cão para
passear. Também se recupera de uma desilusão: a noiva, que foi passar uns dias
nos EUA, decidiu ficar por lá.
Na mesma rua de Martín, em outro edifício, vive Mariana
(Pilar López de Ayala). Ela é uma arquiteta que ainda não fez nenhum prédio e
trabalha como vitrinista. Está de volta a seu apartamento, que deixou quatro
anos atrás para viver um relacionamento que não deu certo. Entre manequins e
caixas de papelão, sofre também de fobias como medo de elevador. Sai apenas
para montar suas vitrines e praticar natação.
Martín e Mariana vivem sua solidão de modos diferentes.
Enquanto ele preenche o vazio de sua vida com banalidades e distrações (jogos,
coleções, internet), ela experimenta de forma muito mais intensa esse vazio;
chora, enclausura-se. Sua companhia é o silêncio, cigarros, manequins, plásticos
bolha.
Ambos ensaiam novos relacionamentos. Uma calada e distante
garota que leva cachorros para passear, a música do piano de um vizinho que
nunca se viu. Em maior ou menor grau, são relações abstratas. Seus “silêncios” e
seus “ruídos” deixam transparecer o quanto não preenchem, o quanto são
artificiais.
Como se suas vidas fossem a metáfora dos pequenos e mal
iluminados apartamentos em que vivem, sentem que precisam abrir mais janelas.
Mais luz e outras perspectivas é o resultado disso, quando quebram a parede do
apartamento. Abrem suas janelas na lateral do prédio, na “medianera” do
edifício. Sorriem quando começa a surgir essa nova janela. O gesto de fazê-la
um pouco com as próprias mãos anuncia o desejo que têm de se abrir mais para o
mundo e mais para a vida. Vai-se, pouco a pouco, a penumbra de seus
apartamentos.
Estreia do diretor Gustavo Taretto em longa metragem, o
roteiro enxuto e a narrativa dosada trabalham com inteligência, humor e carisma
a solidão desses personagens. Apesar das semelhanças e da proximidade
geográfica entre eles, é a cidade - e seus edifícios - que os distanciam.
Na
ironia dessa cidade, muitas vezes se cruzam na multidão, mas não se veem. Um
paradoxo poético, azeitado com a delicadeza dos personagens, uma direção de
grande sensibilidade e um final criativo.
--
0 comentários:
Postar um comentário