Para dar gravidade ao suposto dilema, uma bem realizada sequência
de acidente aéreo. Não sendo o diretor Robert Zemeckis um iniciante, segue com
competência a cartilha do filme desastre. Mas a partir daí, o filme toma rumos
diversos para desembocar em um melodrama bastante superficial.
Acontece que Whip é alcoólatra e usuário frequente de drogas.
Está separado da esposa e raramente vê o filho adolescente com quem pouco se
dá. É com estado toxicológico alterado que ele assume o comando de um voo para
Atlanta, ao lado de um copiloto bem menos experiente. Quando algo dá errado e o
avião simplesmente começa a cair, Whip demonstra frieza e controle. Lançando
mão de uma manobra espetacular, consegue estabilizar a aeronave e aterrissá-la
num campo espaçoso. Os estragos são grandes, mas apenas seis pessoas morrem
entre as mais de 100 que estavam a bordo.
O melodrama surge quando o piloto herói é confrontado com
exames de sangue que revelam alto nível de álcool e cocaína. Começa aí uma
mudança no filme, cujas promessas de dilema moral vão gradativamente sendo
abandonadas e novos personagens entram na trama.
Com uma narrativa sem foco, O Voo vai cada vez mais se parecendo a um telefilme ruim. No
hospital, Whip conhece Nicole (Kelly Reilly) uma viciada em heroína. Enxergando
nela o drama que não consegue admitir em si mesmo, busca ajudá-la. Enquanto
isso, seguem as investigações sobre o acidente e a apuração de sua
responsabilidade nele.
De roteiro esquemático, a narrativa se arrasta até o final, sempre
mergulhada no drama sobre o vício, mas sem um foco sobre seu viciado principal.
Nem drama familiar, nem drama de reabilitação, nem drama investigativo, nem
drama de tribunal. Embora todas essas possibilidades se apresentem em algum
momento, o filme não leva nenhuma adiante. No máximo, salta de uma para outra
sem definição.
Nem mesmo o protagonista dessa história sem rumo parece ter
alguma profundidade. Isso apesar do talento de Denzel Washington, que aqui não
faz grande esforço, mas ainda atua com firmeza. Exceto por algumas pinceladas
no passado e na relação com o pai, também piloto, nada parece dar estofo ao
personagem.
Mais grave é o caso de Nicole, cuja presença no filme é de
uma falta de profundidade desanimadora. Completa esse quadro de personagens
micro dimensionais duas aparições de John Goodman como um fornecedor de drogas
que anda por aí com a desenvoltura de quem vende doce para crianças.
No seu desenrolar frágil, O Voo caminha para um desfecho inteiramente conservador. Quer dar a
seu personagem uma redenção tão de última hora que soa sem sentido, além de
artificial. Um paradoxo dentro da intenção moralista do filme, que quer redimir
seu personagem para fazer dele uma lição de moral. Mas executa tão mal esse
propósito que a lição acaba perdendo seu sentido. Assim, todo dilema moral
desenhado no início resulta em um moralismo fajuto, que não bastando seu discurso
empoeirado, ainda sofre de um vazio incoerente.
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Flight
Robert Zemeckis
EUA, 2012
138 min.
Trailer
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