quarta-feira, julho 25, 2012

Aqui é o Meu Lugar


 É difícil lembrar de algum filme recente que tenha andado tão à beira do abismo como este novo trabalho do diretor italiano Paolo Sorrentino. Isso porque no cinema século 21, arriscar-se em uma ideia diferente é algo cada vez mais raro neste segmento onde poucos se arriscam a sair – e também tirar o espectador – da zona de conforto.

Aqui é o Meu Lugar, que estreia neste final de semana, fica como uma agradável exceção à regra. Não que seja filme de grande inventividade. Sua trama - de personagem que emprega viagem em busca de algo e acaba sendo transformado pela viagem, num processo de autodescoberta - está mais do que desgastada. Mas em Aqui é o Meu Lugar todo o processo ganha uma estranheza rica e saborosa, toda ela apoiada no personagem e na atuação de Sean Penn. Pois é da coragem em assumir essa estranheza – e os riscos que ela traz – que torna a experiência do filme algo tão positivo e singular.

Sean Penn encarna Cheyenne, uma figura descontextualizada nos dias de hoje, fruto daqueles estranhos anos 80. Porque antes de existirem os emos, existiram os góticos. É dessa última tribo que veio o sucesso de Cheyenne, líder, no passado, de uma famosa banda de rock gótico. Mas ele abandonou a vida artística depois que dois jovens cometeram suicídio inspirados por suas músicas sombrias. Contudo, mesmo longe dos palcos e dos estúdios, manteve o mesmo estilo de se vestir e maquiar.

Casado, vivendo recluso na Inglaterra, ele se vê obrigado a voltar para os EUA, para o enterro de seu pai, com quem não falava há 30 anos. Descobre então que seu pai, um judeu sobrevivente do holocausto, passou toda sua vida obcecado em encontrar o nazista que o torturou e que vive também na “terra dos livres e lar dos bravos”. Cheyenne decide então terminar a busca do pai.

Misto de fábula cômica com drama quase nonsense, mas sem jamais afundar o pé em qualquer gênero, Aqui é o Meu Lugar se desdobra como filme de estrada. A razão de ser, claro está, é a figura de Cheyenne. Não apenas pelo riso tímido desconcertante, não apenas pelo jeito peculiar de se mover, nem pela fala monocórdia e tampouco pela maquiagem extravagante. Mas principalmente pelo quanto este personagem se encontra perdido de si mesmo.

Como disse antes, o tema da busca de si mesmo não é novo. O próprio filme brinca com isso quando Cheyenne rejeita esta ideia, sugerida pela esposa, dizendo que viajou para o Novo México, não para a Índia. Mas o fato é que sua jornada, desde o início, indica claramente essa busca por si mesmo.

Mesmo com o foco na sinuosa jornada de seu protagonista, o filme não descuida daqueles com quem ele cruza em seu caminho, e cujas vidas acaba tocando (ou sendo ele por elas tocado). De alguma fora, todos estes por quem ele passa ganham também uma dimensão humana. Esta capacidade de fazer um personagem fugaz crescer em poucos minutos é uma das melhores qualidades do filme.

Para os mais necessitados de explicações mastigadas, Aqui é o Meu Lugar pode não agradar. Este é um filme que por onde passa deixa pontas soltas, um problema para quem precisa de explicação e ponto final em tudo. Mas é preciso entender que estas pontas soltas são a própria natureza do filme, cuja intenção é deixar abertas as possibilidades de todos, exceto as de Cheyenne, que terá seu encontro dramático numa ótima cena com o ator Heiz Lieven.

Arrastando seus pés na borda do abismo do caricato e apresentando uma história também sempre perto de não funcionar - mas que acaba funcionando -, este filme de Sorrentino se mostra uma oxigenada surpresa diante da monotonia do cinema atual.
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This Must Be The Place
Paolo Sorrentino
Itália/França/Irlanda, 2011
118 min.

Trailer

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