quarta-feira, maio 04, 2011

A Garota da Capa Vermelha



 Red Riding Hood
Catherine Hardwicke
EUA/Canadá, 2011
100min.

Transformar a fábula de Chapeuzinho Vermelho em uma história de terror e suspense, com atmosfera sombria e erotização dos personagens, não é uma novidade. O diretor Neil Jordam (de Entrevista com o Vampiro) já havia realizado um filme nesses moldes em 1984. Intitulado “A Companhia dos Lobos”, o filme de Jordan, apesar de ter ficado datado em seus efeitos e maquiagem, preserva ainda uma eficiente atmosfera sombria de pesadelo.

“A Garota da Capa Vermelha” é a mais nova produção a tomar a mesma fábula como partida para uma aventura nada infantil. O filme surge como parte do que parecer ser uma nova onda de adaptações “desinfantilizadas” e aventurescas de fábulas clássicas. Nesse sentido, ainda deve vir por aí “João e o Pé de Feijão” como uma aventura de combate a gigantes e “João e Maria” como uma história sombria de caçadores de bruxas.

Desde seu material de divulgação (trailer, cartazes), “A Garota da Capa Vermelha” indica a promessa de um visual interessante, capaz de seduzir as novas gerações, tão fascinadas pelos elementos da franquia “Crepúsculo”. A semelhança não é casual, a diretora, Catherine Hardwicke, é a mesma do primeiro filme da série sobre vampiros e lobisomens apaixonados, suspirosos e cheios de hormônios. Nesse contexto, o filme exercita a mesma estética e temática semelhante à da série de grande sucesso. Estão lá os personagens no vigor da juventude, cheios de ansiedades sexuais. Donos de uma vibrante beleza juvenil, confrontam-se com seus instintos, sonhos românticos e paixões desenfreadas.

Valerie (Amanda Seyfried) vive com seus pais em uma vila que há duas gerações é aterrorizada por um lobo. No entanto, um pacto entre os moradores e a fera faz com que os ataques a pessoas sejam interrompidos em troca de um animal como oferenda em noites de lua cheia. Quando o pacto é quebrado e uma garota da vila é morta, os moradores decidem caçar o lobo, o que desencadeia mais mortes e revelações que afetarão profundamente a vida dos moradores.

O filme pode agradar aos fãs do universo de Crepúsculo, dada as inevitáveis semelhanças. Mas “A Garota da Capa Vermelha” tem falhas primárias na construção de sua narrativa e no enlaçamento de seus personagens. Apoia-se em um roteiro simples, que embora crie uma certa tensão e expectativa, acaba por resolver os desenlaces apresentando motivações discutíveis.

Com os personagens, o que mais incomoda é a superficialidade com que são colocados dentro da trama. Além de pouco elaborados, sem qualquer profundidade dramática ou emocional, ainda reagem a grandes revelações com alguma inexpressividade, como se fosse comum e cotidiano descobrir segredos de família. A narrativa é atropelada, os acontecimentos se sucedem sem tempo para a absorção de suas consequências. Amanda Seyfried, um dos rostos mais bonitos da nova geração de Hollywood, não convence como uma assustada garota, vítima perseguida por uma fera sobrenatural.

O filme consegue algum sucesso na direção de arte, embora explore muito mal o potencial simbólico das cores e dos contrastes do cenário. Ambientado em uma floresta invernal, com neve por todos os lados, o contraste entre o vermelho vivo da capa de Valerie e a brancura da neve poderiam ser elementos sutis do conflito entre a pureza e a inocência - articulados com violência e mistério – contra o pecado e a perda dessa inocência.

Quanto aos efeitos especiais, a figura do lobo deixa a desejar. Em suas aparições, de onde se podia esperar uma ação visceral intimidante, o afastamento da câmera acaba por esvaziar esse efeito. Assim, a criatura que deveria ser assustadora pela construção mítica do medo (vide “A Vila”, de M. Night Shyamalan, como ótimo exemplo disso) se torna apenas uma fera violenta e descontrolada. Com isso, perde-se qualquer possibilidade de nuance, que tornaria a fera em um predador astuto, à espreita de sua presa, transformando expectativa em suspense e terror.

No geral, sobra apenas o mistério da última grande revelação, que explicará todos os acontecimentos inesperados que pontuam a narrativa. E, para quem gosta de torcer pela mocinha e pelo herói, tem também o romance, com seus percalços e dramas. Algo que pode servir como linha de interesse e empatia do público jovem.

Para uma história com potencial cênico, dramático e lúdico, “A Menina da Capa Vermelha” é uma decepção, pois deixa de lado grande parte desse potencial e realiza um filme de fracas emoções e nenhuma nuance.

(Texto publicado originalmente no Portal Guia da Semana)
--

0 comentários:

 

Eu, Cinema Copyright © 2011 -- Powered by Blogger