A primeira sensação causada pelo cartaz do filme Entre Abelhas é de estranhamento. Do
título que não diz nada à figura do ator Fábio Porchat com expressão grave,
quase melancólica, a confusão é imediata. Comédia ou drama?
Nem tanto ao mar, nem tanto á terra, Entre Abelhas se coloca no meio do caminho. Enquadra-se melhor na
falta de esquadro. Se gêneros são formas de facilitar a catalogação das coisas
(facilidade para explicar, facilidade para entender, facilidade para rotular),
a dificuldade de ajustá-las dentro disso gera sempre algum desconforto.
Tratando-se de cinema, isso é, no mínimo, bom sinal.
Bruno (Porchat) acaba de se separar da mulher. Na sua
“despedida de casado”, cercado de amigos e de mulheres em um puteiro, parece
não se divertir tanto assim. Perguntado por uma das prostitutas sobre o que
motivou a separação, descobre que não sabe a resposta. Um indício, contudo,
pode estar numa cadeira vermelha que o protagonista nota no recinto. É o
primeiro passo para o insólito.
Aos poucos, Bruno vai deixando de enxergar as pessoas.
Literalmente. Ele simplesmente não as vê. Um skate que corre sem ninguém em
cima, um esbarrão aparentemente sem sentido, um ônibus que para no ponto, abre
a porta e ninguém desce. Gradativamente, o insólito vai tomando conta da vida
de Bruno à medida que sua separação vai se tornando mais sólida, visivelmente
sem volta.
Morando com a mãe – uma Irene Ravache na medida para o papel
–, experimenta situações cômicas quando ela tenta ajudar. Grande parte da graça
do filme vem da troca bem azeitada entre Ravache e Porchat. Outra parte vem de
alguns rostos e nomes que ficaram conhecidos a partir do fenômeno Porta dos
Fundos. É de onde vem também a direção.
Ian Sbf dirige e coassina o roteiro com Porchat. Nesta
direção, é possível notar alguns vícios de quem está acostumado a filmar para a
internet, como o uso insistente de planos fechados. Mesmo assim, o filme tem um
ritmo afinado, sem sobras ou excessos no desenvolvimento da trama. Aproveita
ainda o cenário de um Rio de Janeiro longe dos clichês turísticos, mais urbano,
concentrado em lugares normais e pessoas comuns. Um espaço adequado para a
construção do personagem e seu distúrbio.
Assim, a solidão e a depressão encontram na crescente invisibilidade
dos outros uma metáfora óbvia, porém eficiente. Ela serve corretamente para criar
uma atmosfera na qual o inusitado da situação equilibra aquilo há de cômico e o
que há de triste. Em alguns momentos, o filme alcança uma beleza singular, como
nas caminhadas de Bruno pelas ruas, cercado – e tentando não esbarrar – em
pessoas que não vê.
A graça, por sua vez, é meio torta. Habita situações cômicas
que de tão improváveis resultam em um riso muitas vezes atravessado. Aproxima-se
do nonsense, mas uma certa gravidade limita os exageros e isso funciona bem.
Fábio Porchat não decepciona como ator dramático. Mantém seu
gestual contido e dosa a veia cômica, sustentando o perfil dramático de seu
personagem sem afundá-lo completamente. Por mais contraditório que possa
parecer para um filme que tem sua base no improvável, este equilíbrio cria um
protagonista mais próximo da realidade. Mais reconhecível, portanto.
Na sua proposta, Entre
Abelhas se coloca em um difícil equilíbrio. Porém, com poucos deslizes, consegue
sustentar sua trajetória. Se o roteiro apela para algumas facilidades na
resolução de conflitos paralelos – que, na verdade, se mostram absolutamente
desnecessários para a trama, como o problema extraconjugal do melhor amigo –, seu
desfecho permite um sorriso bem resolvido no rosto do espectador.
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Entre Abelhas
Ian Sbf
Brasil, 2015
99 min.
Trailer