terça-feira, novembro 25, 2014

Interestelar


Diferentemente do que pode parecer em uma primeira análise, Interestelar não é um filme pretensioso. Portanto, comparações com 2001 – Uma Odisseia no Espaço, de Stanley Kubrick, e Solaris, de Andrei Tarkovsky, soam como aproximações preguiçosas. Estes filmes apresentam uma reflexão profunda e colocam o espectador na incerteza provocativa sem respostas definitivas.

Já o filme de Christopher Nolan permanece no campo que ele conhece bem: a superfície de princípios complexos mantidos dentro de razoável inteligibilidade para satisfação do grande público. Não há pretensão nisso. Até porque, no final, todas as respostas estão lá, mastigadas. As que não estão se deve menos a uma intenção reflexiva e muito mais à incapacidade do filme em amarrar os elementos do roteiro.

Em um futuro próximo, Cooper (Matthew McConaughey) é um engenheiro e ex-piloto da NASA, viúvo e pai de dois filhos. Como a maioria das pessoas na Terra, teve de abandonar sua carreira para se tornar fazendeiro e ajudar a suprir um colapso global de abastecimento de alimentos. Mas a ameaça da fome se junta agora a uma iminente extinção da vida humana no planeta, provocada por mudanças climáticas. É quando Cooper descobre que a NASA, que se pensava estar desativada, mantém um programa secreto para encontrar outro planeta capaz de abrigar vida humana. Cooper, então, é convidado a comandar a missão exploratória.

É neste momento que o filme joga fora grande parte de seu potencial. Porque se a ficção de um modo geral se baseia muitas vezes na suspensão da descrença, é sabido que esse efeito não nasce do nada: é preciso construí-lo. Mas aqui não se trata de acreditar na história, na viagem, na tecnologia ou nos fenômenos quânticos da física, trata-se de acreditar no protagonista.

Do momento em que Cooper descobre a missão – fato que vem acompanhado por uma típica sequência de explicações didáticas no estilo “visita monitorada a museu” – até sua decisão de deixar filhos, vida, fazenda, planeta e galáxia para trás, não há tempo nem construção narrativa suficiente para dar a dimensão de sua escolha. Essa falha é mais grave quando se percebe que todo o desenvolvimento dramático de seu personagem será ancorado exatamente nessa escolha, na perda e riscos que ela impõe.

Por deixar de lado essa amarração tão básica, o filme esteriliza ainda mais o que já nasce sob o risco do estéril. Se não há na sua travessia pretensões filosóficas ou grandes temas humanos (ao menos não tratados com o mínimo de seriedade e perspectiva), diante do didatismo de suas explicações o que sobra é o exibicionismo visual.

O resultado só não é totalmente ruim porque nesse quesito Nolan costuma se sair bem. No caso, sai-se melhor ainda por ter sido fiel na representação de alguns fenômenos comprovados pela ciência, como buracos negros giratórios, distorção do espaço-tempo pela ação gravitacional e o ainda polêmico, mas sempre discutido, buraco de minhoca.

Em sua composição visual, o filme impressiona. Não é difícil deslumbrar-se com o desenvolvimento de seu segundo ato, quando mergulhamos na viagem e nos deparamos com o desconhecido. Ali, o diretor mostra competência na criação de uma atmosfera angustiante, fazendo bom uso da montagem paralela para estabelecer uma conexão forte entre os acontecimentos da missão e os acontecimentos na Terra. É quando se tem a melhor fruição do filme, apesar do exagerado falatório explicativo dos personagens.

Contudo, falta silêncio em Interestelar. Perdem-se, assim, grandes oportunidades de não falar nada. Como na irritante tentativa de qualificar o Amor como um elemento que faz parte do enlace quântico do espaço-tempo. Isso é piorado pela solução imaginativa para resolver o último embaraço da trama, quando o filme culmina em uma experiência multidimensional que soa estimulante e fabulosa no início, mas diluída e sem nexo sob um segundo olhar.

Com suas fragilidades – entre as quais está a atuação de todo elenco, com exceção de Jessica Chastain, única capaz de transmitir alguma emoção –, Interestelar fica como uma boa sinfonia sem alma. Isso porque tenta impor um sentimentalismo que se pretende tão grande quanto a distância intergaláctica que percorre o filme. Todo esse sentimento só evidencia a esterilidade de seu conjunto, que se mostra imenso e justo ao tratar do cosmo, mas decepcionante quando se trata da dimensão humana.
--
Interstellar
Christopher Nolan
EUA/Reino Unido, 2014
169 min.

Trailer


 

Eu, Cinema Copyright © 2011 -- Powered by Blogger